Por
Rosane Menezes Lohbauer e Rodrigo Sarmento Barata
Ocasionalmente
lembrado de forma acessória ou muitas vezes esquecido, o transporte hidroviário
vem ganhando espaço no cenário brasileiro. Com algum crescimento na navegação
de cabotagem e muitos olhos voltados às hidrovias, mais um potencial nacional
parece ter sido tardiamente descoberto.
Com
mais de 40mil km de rios navegáveis, o Brasil começa a apontar no
desenvolvimento de um modal que conta com uma eficiência energética 29 vezes
superior ao transporte rodoviário, com seis vezes menos emissão de CO2, 18
vezes menos emissão de NOx e 19 vezes menos consumo de combustível. A vantagem
também é expressiva se comparado ao setor ferroviário.
É
de se mencionar que as hidrovias, por se instalarem em recursos naturais, não
podem ser simplesmente implantadas em qualquer local – daí a importância de
também se investir em rodovias e ferrovias. Mesmo assim, com o potencial legado
ao Brasil, por que ainda não investimos nesse modal? A pergunta pode não levar
a nenhuma explicação, mas traz uma sinalização pelo desenvolvimento do
transporte hidroviário, com todos os benefícios que disso poderemos auferir.
Ao
considerarmos a pergunta, surge outro questionamento: quais os desafios para
melhorarmos nossa infraestrutura hidroviária? Neste artigo, tentaremos apontar
alguns caminhos para chegar a esta resposta.
O
primeiro grande desafio é a criação de um ambiente institucional favorável ao
investimento. Para tanto, seria importante medidas como a consolidação e
organização da regulação setorial. Além do pouco tratamento do assunto, o
ambiente também está desorganizado. Para dar um exemplo, as hidrovias
permaneceram sob administração do Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes (DNIT), mesmo após as reformas e criação da Agência Nacional de
Transportes Aquaviários (ANTAQ) e da Secretaria de Portos da Presidência.
No
DNIT, ficavam sob responsabilidade das Administrações Hidroviárias que, por sua
vez, enfraquecidas, firmaram convênio de apoio técnico e financeiro com a
Companhia Docas do Maranhão, intuitivamente não espalhada pela geografia
nacional. A questão ambiental é outro exemplo: o governo precisa atuar para dar
uma clara definição na forma de licenciamento ambiental das hidrovias. Seja
pela análise da hidrovia como um todo ou pela avaliação individual de cada obra
realizada, uma definição deve ser pacificada.
O
segundo desafio está relacionado com o planejamento e a estruturação de
projetos de qualidade. Por aí passam definições como o modelo exploratório (por
exemplo, uma concessão integral, como a de rodovias, ou um modelo que incentive
a concorrência, como o novo modelo ferroviário). Nessa avaliação, um aspecto de
suma relevância deverá ser considerado: a manutenção das hidrovias.
Todo o
serviço de dragagem e sinalização demandam qualidade e altos custos, além de
serem essenciais ao bom funcionamento do modal. O governo federal sinalizou
viabilizar contratos de dragagem e manutenção por períodos de 10 anos, criando
assim um modelo contratual fora das limitações da Lei de Licitações, mas
distinto das concessões.
A
elaboração de projetos de qualidade também é fundamental. Especialmente no
levantamento hidrográfico e topográfico da malha, demanda-se investimento em
tecnologias de ponta para a avaliação de viabilidade hidrográfica. O DNIT está
executando o trabalho, com cerca de R$ 81 milhões investidos nos estudos de
nove hidrovias.
Por
fim, reflexo de nosso atraso neste setor é a interface e as soluções que
deverão ser elaboradas para permitir a implantação de eclusas que viabilizem a
navegação em trechos onde foram instaladas usinas hidrelétricas, sem qualquer
previsão da situação atualmente vivida. Caso os projetos hidrelétricos tivessem
acompanhado os investimentos hidroviários, o problema poderia inexistir.
Em
levantamento do GT Eclusas, grupo de trabalho sobre eclusas constituído no
governo federal, 62 eclusas prioritárias foram apontadas, chegando-se a uma
estimativa de investimentos de R$ 28,6 bilhões para viabilização das
estruturas. O problema está, primeiro, na indefinição gerada entre os
Ministérios dos Transportes e Minas e Energia sobre a forma de financiamento
deste investimento. De um lado, argumenta-se que a matriz institucional sempre
determinou a exploração conjunta e coordenada do potencial hidroviário com a
exploração energética, e isto não estaria ocorrendo. Do outro, dizem que o
investimento deveria ser do ministério interessado, o dos Transportes. Soluções
de engenharia e de financiamento, bem como a construção de mecanismos
jurídico-institucionais viáveis são as demandas.
Com
estas breves considerações, ainda que em parte superficiais, pretende-se abrir
uma pauta de discussão sobre esta esquecida riqueza nacional, que pode
contribuir em peso na melhoria da produtividade da economia do País.
Rosane
Menezes Lohbauer e Rodrigo Sarmento Barata são, respectivamente, sócia e
associado do escritório Madrona Hong Mazzuco Brandão – Sociedade de Advogados
(MHM).
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