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Por Caio Megale
Educação foi uma
das palavras mais repetidas durante as manifestações que marcaram o mês de
junho no Brasil. Faz sentido. Apesar dos avanços das últimas décadas,
especialmente na proporção de crianças que se matriculam no ensino fundamental
e no número de anos de estudo médio por habitante, ainda estamos defasados.
Pesquisas sugerem que a qualidade do ensino evoluiu pouco, professores ainda
são mal remunerados e o desempenho dos alunos brasileiros em testes
internacionais é abaixo da média.
Essa constatação,
cruzada com dados do mercado de trabalho, é fundamental para entender o estágio
atual da economia brasileira. Não é de hoje que a educação no Brasil precisa melhorar.
Mas no passado não muito distante, a falta de educação formal no país era menos
importante para explicar seu crescimento. Na década de 90, por exemplo, a taxa
de desemprego era perto de 15% e tínhamos muita gente bem qualificada
desempregada. Se uma empresa precisasse ampliar seu quadro de funcionários, era
fácil (e relativamente barato) contratar.
O Brasil crescia
pouco por outras razões: hiperinflação, fragilidade no balanço de pagamentos,
mercado de crédito pouco desenvolvido, alto endividamento público. Nesse
ambiente não conseguíamos desenvolver o mercado doméstico pujante. A restrição
estava na falta de demanda, e não em fatores de oferta (como mão de obra
qualificada). Talvez, por isso, não tivéssemos o incentivo de investir em
qualificação e produtividade do trabalho.
Conforme superamos
esses desafios, passamos a crescer mais aceleradamente. Por quase dez anos, o
PIB avançou a mais de 4% ao ano impulsionado pela demanda. Desde 2011, no
entanto, limitações de oferta vêm nos levando a um crescimento mais baixo. A
falta de qualificação agora nos faz falta.
O desemprego hoje
está próximo de 5% e o custo do trabalho passou a ser uma das principais
preocupações de gestores de empresas de diferentes tamanhos e regiões do país.
Especialmente porque a forte alta dos salários reais nos últimos dez anos não
tem sido acompanhada de ganhos relevantes de produtividade, pressionando o
chamado "custo unitário do trabalho". A disposição para contratar é
menor, como revelam dados do Ministério do Trabalho (Caged).
Como desejamos que
os avanços do mercado de trabalho sejam mais permanentes, a melhor forma de
equacionar o problema do produtor é por meio dos ganhos de produtividade.
Estudos mostram que a educação é uma maneira eficiente de melhorar a
produtividade e o crescimento potencial à frente. É possível, inclusive,
quantificar o efeito da melhor educação no crescimento econômico, usando, por
exemplo, os resultados do Pisa- o teste da OCDE, que mede os conhecimentos e
habilidades de adolescentes de 15 anos de idade, ao redor do mundo. Hanushek e
Woessmann (2010) estimaram que um avanço de 100 pontos no teste aumenta o
crescimento do PIB, em média, em 1,86 ponto percentual. Para o Brasil, isso
significa que, se tivéssemos um desempenho no teste semelhante ao do Chile,
alcançaríamos um crescimento médio, ao ano, de 3,5% até 2020. Se atingíssemos a
média dos países da OCDE, o crescimento seria de 4,4%. Aos níveis atuais de
desempenho do País, estimamos que o crescimento médio não chegue a 3% na média
dos próximos anos.
Defasagem
educacional implica baixa qualificação média do trabalhador. Segundo dados do
Banco Mundial, apenas 10% da força de trabalho no Brasil possui ensino superior
completo, ante 25% no Chile e 40% no Peru. Nada menos do que 40% dos
trabalhadores no país possuem apenas ensino fundamental.
A boa notícia é
que, pressionado, o país começa a responder. Muitas empresas estão investindo
em treinamento e na qualificação de seus funcionários. O governo anunciou que
pretende destinar os royalties do petróleo à educação pública. Apenas gastar
mais não resolve, é preciso gastar bem e com foco, especialmente na escola
fundamental. Outros destinos para o investimento também são importantes.
Pesquisas indicam que uma criança mal nutrida e sem condições básicas de
saneamento nos primeiros dois anos de vida pode ter sua capacidade cognitiva
comprometida para sempre.
Podemos ajudar
nessa transformação também dentro de casa. Em artigo recém publicado, Kalb e
van Ours (2013) reúnem evidências de que ler para os filhos desde seus
primeiros anos aumenta a capacidade de concentração das crianças e, entre
outras vantagens, aumenta sua probabilidade de ser um bom (e bem remunerado)
profissional no futuro. Como são dados para muitos países - a maioria
desenvolvidos, com maior nível de educação - é possível que os efeitos no
Brasil sejam ainda maiores.
A escola ajuda, mas não basta: precisa dos pais (ou
adultos) que cuidem das crianças em casa. Como o analfabetismo entre adultos
vem caindo no Brasil (10% hoje, contra 26% há 30 anos), são muitos os que
conseguiriam fazer esse esforço (que pode ser muito prazeroso) por pelo menos
15 minutos ao dia. Essa é apenas uma ação entre muitas possíveis. Não por acaso
o desempenho da criança é muito correlacionado com a educação de seus responsáveis.
O clamor das ruas
reforça a necessidade urgente do avanço. Transformar a educação requer
paciência e perseverança. É preciso investir de forma eficiente, principalmente
na escola básica, para que os brasileiros cresçam em igualdade de condições. As
empresas e as famílias também têm seu papel. A educação sólida e consistente
para todos abre espaço para ganhos de produtividade e para um crescimento mais
sólido e equânime ao longo do tempo.
Caio Megale é
Economista do Itaú Unibanco. Originalmente publicado no Valor Econômico de 16
de Julho de 2013.
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