Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Carlos Rodolfo Shneider
O Brasil gastou o que tinha — os
ganhos com o boom das commodities — e o que não tinha — o aumento do
endividamento —, e agora tem uma ressaca para resolver. A falsa ideia de que
prosperidade se mede pelo volume dos dispêndios nos colocou nessa crise fiscal.
Ainda agora, na discussão da PEC do teto dos gastos, pressionou-se pelo aumento
das despesas com Educação e Saúde. Certamente a sociedade brasileira não está
satisfeita com a qualidade desses serviços, menos ainda se considerarmos o
volume de impostos que se paga.
Aliás, temos a pior relação no mundo
entre tributos pagos e serviços prestados pelo Estado. Isso mostra que não é
bem uma questão de quantidade de recursos alocados e, sim, de qualidade dos
gastos. Na Educação, por exemplo, gastamos em torno de 6% do PIB, mais do que a
maioria dos países, mesmo aqueles que, como a Coreia do Sul, destacam-se nos
primeiros lugares dos testes internacionais de proficiência, como o Pisa,
ranking global em que o Brasil tem ocupado as últimas posições.
Essa gastança não só trouxe a
insolvência de inúmeros entes federativos, como levou a carga tributária a
níveis insustentáveis, a taxa de juros a um dos patamares mais elevados do
planeta e colocou a dívida pública numa rota preocupante. A dívida bruta, que
representava 51,7% do PIB em 2013, 66,2% em 2015, ultrapassará os 70% este ano,
numa trajetória para alcançar os 100% em pouco tempo. Com um agravante sério:
trata-se do maior serviço de dívida do mundo.
Trajetória semelhante ao de muitas
famílias, que estimuladas a gastar, fizeram-no além da capacidade de pagamento,
tendo que contar ainda com o imprevisto da perda de emprego. Como o Brasil está
tendo que enfrentar o fim da bonança do boom das commodities. A imprudência faz
esquecer que após um período de vacas gordas pode vir um de vacas magras.
É hora de arrumar a casa, de estancar
o processo que tem levado o poder público a gastar mais do que arrecada; mais
do que isso, é hora de inverter uma perniciosa trajetória na qual o governo
vinha se apropriando de parcela crescente da riqueza gerada pela sociedade, via
aumento de tributos. Pior: tributos gastos em sua maioria de forma ineficiente,
muito para manter a própria máquina pública e devolver serviços de baixa
qualidade — cerca de 20% do PIB — e pouco para investir nas bases para o
crescimento do país — não mais de 2% do PIB.
Louvável é o esforço da equipe
econômica para atacar a raiz do problema, apesar da derrapada inicial em que se
permitiram significativos aumentos no custeio dos poderes da República. A
aprovação no Congresso da PEC que limita os gastos, mesmo que idealmente o
limitador devesse ser uma fração do crescimento do PIB, foi um passo
importante. Mas ficará capenga se não estiver escorada na reformulação da
Previdência, que equivale a aproximadamente 45% do gasto primário do governo.
Portanto, espera-se dos nossos parlamentares nesta segunda etapa o mesmo grau
de responsabilidade que demonstraram no primeiro passo já dado.
Também os estados devem fazer a sua
parte, racionalizando gastos, aumentando as contribuições previdenciárias dos
servidores e criando fundos de previdência complementar para eles, e se
dispondo a sentar à mesa com a União para resolver o velho problema da guerra
fiscal, diante das inúmeras concessões e apoios que vêm recebendo do governo
central.
Precisamos converter um círculo
vicioso que atravanca o Brasil em um círculo virtuoso que alavanque o país.
Everardo Maciel mencionou dias atrás um pensamento de José Guilherme Merquior:
no Brasil há Estado de mais e Estado de menos. De mais, no que não precisamos;
de menos, no que precisamos. É necessário voltar às origens e lembrar que ele —
o Estado — existe para servir à sociedade.
Carlos Rodolfo Schneider é
empresário. Originalmente publicado em O Globo em 21 de Dezembro de 2016.
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