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Por Merval Pereira
A decisão do ministro do Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) Herman Benjamin, relator do processo de impugnação da
chapa Dilma-Temer, de mandar, em pleno recesso, a Polícia Federal investigar as
gráficas suspeitas de terem sido usadas na campanha presidencial de 2014 para
lavar dinheiro da propina que a irrigou reforça a indicação de que o relatório
final será a favor da anulação da chapa.
Como deixa evidente a volatilidade da
cena política atual, dependente de atuações policiais, mesmo que as
investigações da LavaJato não possam atingir o presidente, que só pode ser
acusado por atos ocorridos durante seu mandato, elas podem ser usadas no
processo do TSE.
O cientista político Octavio Amorim
Neto, da FGV do Rio, considera que o fator mais possante da política brasileira
nos últimos dois anos é a Operação Lava-Jato, que em suas investigações já
envolveu o próprio presidente Temer e o núcleo duro do governo, o que
enfraquece permanentemente quem está no poder.
Enquanto isso não for resolvido, esse
paradoxo vai continuar, avalia. Podemos ter um presidente com um apoio
altíssimo no Congresso — pelos seus cálculos, Temer teve ao longo desses meses,
desde maio quando assumiu, mais de 2/3 de apoio na Câmara e no Senado, e pelos
dados de pesquisa do “Estadão” esse apoio é maior ainda, de 88%.
Octavio Amorim Neto ressalta que os
parâmetros que regeram a política brasileira desde 1994, na eleição de Fernando
Henrique Cardoso, foram rompidos. “Estamos em uma transição para outro sistema
partidário e para outra forma de conduzir o presidencialismo no país”, e em
2017 ele considera que pode acontecer uma mudança do sistema eleitoral e de
governo. “Estamos diante de uma mudança de época, não está claro o que vem por
aí, e acho que, do ponto de vista analítico, o fundamental é que os parâmetros
que regeram a política brasileira nos últimos 20 anos foram erodidos por essa
crise avassaladora que já levou de roldão a presidente Dilma e que ameaça
Temer”.
Octavio Amorim Neto relembra que uma
regra de ouro da política brasileira é que presidente que não tem maioria no
Congresso não termina mandato: Vargas, Jânio, Jango, Collor, Lula, que quase
saiu em 2005 no mensalão é a exceção, e Dilma, que confirma a regra. “Agora
temos um presidente com um amplo apoio congressual, o governo, que tem um
caráter congressual dito por ele mesmo, e isso não resolve as coisas”.
Claro que sem o Congresso ele
facilmente cairia, ressalva o cientista político, mas ter o apoio amplo do
Congresso não garante o presidente. O que pode acontecer com ele é ter uma
crise de credibilidade radical como teve Dilma, tudo por causa da Lava-Jato. O
grande fator que erodiu os parâmetros estáveis da política brasileira é a
LavaJato, ressalta.
O cientista político Carlos Pereira,
também da FGV do Rio, concorda, e avalia que, a não ser que apareça uma delação
premiada que desmoralize completamente o presidente Temer, o mais provável é
que o governo consiga ser um modelo ultrarreformista e termine o mandato com
esse legado.
Carlos Pereira não descarta a
possibilidade de o Tribunal Superior Eleitoral decidir impugnar a chapa
presidencial, encurtando o mandato de Temer, mas crê que essa possibilidade
pode ser reduzida se a situação econômica começar a dar sinais de equilíbrio.
“Seria criar mais um choque”.
Mas Carlos Pereira não tem dúvidas:
se tiver que ter uma saída judicial através do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), tem que ser, está dentro da legalidade. Para Pereira, a crise atual tem
muito mais a ver com o aprofundamento das investigações da Lava-Jato, com os
políticos percebendo que chegou a hora deles, e, numa tentativa de
sobrevivência, tentando enfraquecer, intimidar o Judiciário, as organizações de
controle de uma forma geral.
Mas uma coisa é certa, diz Carlos
Pereira: se Temer vier a não terminar seu mandato, uma possibilidade que pode
vir a acontecer, não será por dificuldades decorrentes de governabilidade, de
problemas com os partidos políticos.
Merval Pereira é Jornalista e membro
das Academias Brasileiras de Letras e de Filosofia. Originalmente publicado em
O Globo em 28 de dezembro de 2016.
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