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Por Gaudêncio
Torquato
“O pau que nasce torto não tem jeito, morre torto”. O popular ditado cai
bem nesse momento sobre a cabeça dos dirigentes do PT. O novo governo nem
começou e o Partido dos Trabalhadores volta ao palanque com seu verbo ácido e
mal humorado, a confirmar o velho lema que o tem distinguido ao longo de três
décadas de existência: “se hay gobierno, soy contra”.
Assim pensa: “o único governo que prestou e deve ser reconhecido como o
melhor do país em todos os tempos foi o nosso”. Não há como argumentar com
mentes empedernidas que se acostumaram a repetir mantras nas ruas e nas praças
para louvar as “vestes imaculadas” de um corpo enlameado nos dutos do mensalão
e do petrolão.
O PT não desce do pedestal. Na noite da derrota, Fernando Haddad fez
questão de inverter a aritmética, elevou aos píncaros da glória seus 47 milhões
de votos, convocou a militância para resistir e não ter medo, avocando-se como
o professor-guerreiro “que não foge à luta, nem teme quem adora a liberdade à
própria morte”. A ferocidade petista voltou à garganta de Gleisi Hoffmann.
Certamente como deputada desfilará, logo no primeira dia da legislatura,
o dicionário raivoso com que o PT construiu o apartheid tão conhecido como o
“Nós e Eles”.
A democracia, como todos sabem, pressupõe o jogo dos contrários. O
embate de ideias entre protagonistas é salutar para a construção de um sistema
em que a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, o direito à livre
associação, o direito de locomoção, o livre exercício dos cultos
religiosos constituem, entre outros, pilares fundamentais.
Esse é o cerne da nossa Lei Maior, a Constituição de 88, para a qual o
PT, aliás, deu as costas por ter se recusado a assiná-la. Convém lembrar que,
no início da redemocratização, o partido não votou em Tancredo Neves para
presidente, não apoiou Itamar Franco no governo de transição e nem o Plano
Real, que deu estabilidade à moeda.
Uma viseira histórica estreitou o olhar dos dirigentes petistas. Que
sempre cultivaram o conceito de que no Brasil há uma banda sadia, a deles, e
uma banda podre, o resto. O feitiço acabou virando contra o feiticeiro. O PT
perdeu o pleito na esteira da dualidade que cultivou. E que, infelizmente,
voltará a cultivar, haja vista a disposição já manifesta dos próceres petistas
em fazer “oposição por oposição”. Ocorre que boa parte dos partidos que se
alinham no centro-esquerda do arco ideológico não mais perfilará ao lado do PT,
como é o caso de Ciro Gomes e seu PDT.
O petismo tem condições de adensar o oposicionismo no país, caso o
governo Bolsonaro seja um fracasso. A recíproca é verdadeira. Se ganhar
aplausos gerais, a administração comandada pelo capitão reformado do Exército
queimará o estoque de força que o PT ainda detém. Urge esperar. Tentar voltar
às ruas com mobilizações e discurso crítico, sem ver resultados das ações a serem
empreendidas, é um risco.
Que poderá ser evitado caso o partido se dedique a uma intensa reflexão
interna, capaz de apontar erros cometidos e definir rumos a seguir. As alas que
integram o PT estarão medindo forças para escolher os interlocutores dos
próximos tempos. Se a verborragia azeda de Hoffmann persistir, sob a bandeira
do “Lula livre”, é possível prever o acirramento dos ânimos sociais.
O país carece de abrir horizontes mais claros. Espera-se do novo
governante uma palavra moderada, um verbo mais acolhedor, sob o compromisso de
respeito aos princípios constitucionais. A linha divisória que racha o país ao
meio vai ser mais forte ou mais tênue caso os extremos contenham o ímpeto de
seus ataques. O Brasil não merece viver sob eterna campanha de luta pelo poder.
Há demandas prementes que podem ser atendidas, principalmente nas áreas da
saúde, segurança pública, educação e mobilidade.
Enxugar a máquina administrativa, promover as reformas fundamentais –
previdenciária, tributária, política – fazer crescer o número de empregos,
adotar a meritocracia, melhorar a autoestima dos brasileiros, enfim, expandir o
Produto Interno Bruto da Felicidade – são desafios que devem receber o apoio de
todos, partidos e lideranças. Ser contra apenas para ganhar visibilidade e,
mais adiante, voltar ao poder é fazer politicagem, não política no sentido
aristotélico de servir à polis.
É hora de lembrar a lição do Barão do Amazonas, vencedor da
Batalha Naval de Riachuelo: "O Brasil espera que cada um cumpra o seu
dever".
Gaudêncio
Torquato, jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de
comunicação Twitter@gaudtorquato
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