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Por Regis Machado
De início, vale lembrar que “sem-vergonha” não é o mesmo que “sem
vergonha”. Enquanto essa última expressão é formada pela junção da preposição
“sem” com o substantivo “vergonha”, indicando a ausência de um sentimento de
inferioridade ou de indecência, a primeira é adjetivo composto, designando
aquele que não tem dignidade, desavergonhado, sem moral, descarado, cínico,
canalha, devasso, vil. Nos dicionários, seu uso geralmente é ilustrado com frases
do tipo “Existem muitos políticos sem-vergonha no país”.
Longe de ser injusto, esse tipo de exemplo se justifica ao constatarmos
que nossos jornais e noticiários estão recheados de sem-vergonhices sem limites
praticadas por políticos do Executivo e do Legislativo, lembrando-nos,
diariamente, que a maioria dos nossos representantes está muito longe de nos
representar. No mundo inteiro, o Brasil é país cuja população menos confia nos
políticos. Triste realidade.
Porém, solidário aos demais poderes, ou talvez enciumado pelo seu menor
protagonismo midiático, o Judiciário vem se esforçando bastante, ultimamente,
para disputar com a classe política o sentimento de nojo e de repulsa por parte
da população. Em meio a uma crise econômica que gerou e mantém milhões de
desempregados, pressionou o Congresso e o Presidente a aprovarem um imoral
reajuste, de 16,38%, elevando seus nababescos salários para quase R$ 40.000
mensais, fora os penduricalhos, em um efeito cascata que terá impacto de cerca
de R$ 4 bilhões por ano nas contas públicas.
O acordo era a concessão dessa benesse em troca da extinção do
“auxílio-moradia”, uma imoralidade ainda maior. Qualquer pessoa com o mínimo de
bom senso percebe o quão indefensável é que uma casta de privilegiados, cujo
salário pode comprar uma casinha simples por mês e que, consequentemente, já
mora em mansões e apartamentos de luxo, receba tal benefício, enquanto o país
ostenta quase 7 milhões de famílias sem teto. Mas eis que, espertamente, mesmo
após a concessão do reajuste, os Conselhos Nacionais de Justiça (CNJ) e do
Ministério Público (CNMP) decidiram manter o famigerado auxílio. Glu-glu. Ráá.
A última ação dessa campanha de autopromoção do descrédito foi
protagonizada pelo Ministro Marco Aurélio Mello, que, no apagar das luzes antes
do recesso do Supremo Tribunal Federal (STF), monocraticamente, passou por cima
do entendimento do plenário e mandou soltar os presos já condenados em segunda
instância, ou seja, por um juiz e por um colegiado de julgadores. Mantida essa
decisão estapafúrdia, diversos criminosos, muitos deles condenados no âmbito da
Operação Lava Jato, terão seus desejos de Natal atendidos. O caso mais ilustre
é o do ex-presidente Lula. Parece que o “bom velhinho”, este ano, resolveu agir
mais cedo.
Por essas e outras, como não se revoltar com o caso do advogado
Cristiano Acioli, detido pela Polícia Federal, a pedido do Ministro Ricardo
Lewandowski, apenas por expressar que sente vergonha do STF? Deveria ele, por
acaso, ser “sem vergonha”? Impossível. Para o bem do Brasil e o desespero dessa
turma que não perde por esperar pela cada vez mais próxima Operação
Lava Toga, ele teve a coragem de expressar aquilo que onze entre dez dos
cidadãos que carregam este país nas costas pensam: “Sem-vergonhas!!!”
Regis
Machado é Auditor do Tribunal de Contas da União (TCU).
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