Artigo no Alerta
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Por
Gaudêncio Torquato
Jair Bolsonaro, em sua peroração inicial como mandatário-mor da Nação,
fez questão de exibir o manto verde-amarelo que expressa a estética de sua
identidade desde os tempos em que adentrou o território da política. Ao puxar a
bandeira brasileira do bolso e acenar com ela para a multidão, no discurso de
posse no Parlatório do Palácio do Planalto, o presidente procurou enaltecer
compromissos que permearam sua campanha: o verde-amarelismo abriga coisas como
o ânimo cívico, o nacionalismo, a soberania nacional, o combate à ideologia de
esquerda. O fecho de suas mensagens aponta a linha divisória que separa seu
eleitorado de contingentes abarcados pelo lulopetismo e entorno: “essa
bandeira jamais será vermelha”.
A expressão soma mais força em função da origem militar de Bolsonaro.
Mais que outros segmentos, os militares encarnam de maneira intensa a
simbologia nacionalista. De pronto, a primeira fala do presidente definiu o
Brasil, sob seu mando, como enclave poderoso no sul do continente a lutar
contra o ideário da foice e o martelo (o comunismo) e, por tabela o socialismo,
mesmo sabendo que as cores deste foram suavizadas em nossos tempos com a
incorporação de elementos do liberalismo, como a livre iniciativa, formando a
social-democracia, como pode se ver na Europa.
Ocorre que a vertente esquerdista tem se enfraquecido nos países
social-democratas, casos de Alemanha, Itália, Espanha, Hungria, Polônia e até
Suécia, onde entes mais à esquerda têm amargado derrotas. O fato é que a crise
da democracia representativa tem fragilizado seus vetores, implicando
arrefecimento ideológico, declínio de partidos, desânimo das bases,
fragmentação das oposições. Em contraposição, novos polos de poder se
multiplicam – particularmente os núcleos formados no âmbito da sociedade
organizada – sob os fenômenos que hoje agitam a política: a globalização, a
imigração e o nacionalismo.
A globalização rompeu as fronteiras nacionais, instalando
interdependência entre as Nações. A livre circulação de ideias e a troca de
mercadorias contribuem para a formação de uma homogeneidade sócio-cultural,
arrefecendo valores próprios dos territórios e certo prejuízo para os conceitos
de soberania, independência, autonomia. A explosão demográfica, por outro lado,
e as carências das margens sociais, a par dos conflitos armados em algumas
regiões (as guerras modernas), aceleraram processos migratórios. Na Europa,
emerge o temor de que as correntes de imigração não apenas contribuam para a
perda de emprego da população nativa, como resultem mais adiante em impactos
culturais de monta, descaracterizando signos e símbolos das Nações.
Nos Estados Unidos, esses fenômenos têm sido tratados de maneira dura
por Donald Trump, com sua insistência para construir um muro na fronteira com o
México. O cabeludo presidente desfralda a bandeira do nacionalismo sob o
discurso de proteger empregos e melhorar as condições de vida de populações
ameaçadas pelo fluxo migratório. Daí o posicionamento do governo americano ante
a globalização, os compromissos das Nações com o Acordo de Paris sobre
Mudança Climática e o Pacto Mundial sobre Migração, sob a égide da ONU; a
situação de países como Venezuela, Cuba e Nicarágua e a política de defesa de
direitos transgêneros. Os EUA marcam posição nessas frentes.
Nessa encruzilhada, Bolsonaro e Trump marcam um encontro. O pano de
fundo da articulação mostra a integração de esforços para combater ideologias
de esquerda, fortalecer vínculos com entes comprometidos com um ideário
conservador, dar impulso ao liberalismo. No Brasil, o foco será a privatização.
Deixar o Estado com o tamanho adequado para cumprir suas tarefas. E manter o
cobertor social do tamanho que os recursos permitam. Nem lá nem cá. Mais: sem
apoio a núcleos que batalham por direitos. (A indicação de Bolsonaro de que
devemos combater o “politicamente correto” não seria, por exemplo, o
arrefecimento a ideologia de gêneros?).
Em suma, com o resguardo militar, um programa arrojado de alavancagem da
economia, ações na área do campo, forte combate à corrupção, disposição de
cortar as fontes que alimentam a bandidagem, desfralde dos valores da família,
sob as bênçãos de Deus, o novo governo quer “consertar” as coisas erradas. P.S.
Com direito da população de acompanhar tudo isso pela linguagem de Libras. Com
a simpática Michelle, ao lado do marido, abrindo seu cativante sorriso.
Gaudêncio Torquato,
jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de
comunicação Twitter@gaudtorquato
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