Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Paulo Rabello de Castro
Ainda
estamos a salvo. Nossa porta de defesa contra o vírus argentino está bem
trancada pelo elevado nível das reservas cambiais do Brasil. Temos mais de 370
bilhões de dólares no cofre e um saldo corrente do setor externo bem
confortável. Em crises cambiais, é crucial ter amplas reservas e um balanço
equilibrado entre exportações e importações. A Argentina não preenche hoje
qualquer das duas condições.
Desde
os anos 1980, quando nosso Plano Cruzado (1986) reproduziu as mesmas terríveis
bobagens de política econômica que haviam sido anunciadas no Plan Austral
(1985) no país vizinho, agora as nuvens escuras do “Eu serei você amanhã!”
voltam a povoar nosso imaginário. Mas é bom lembrar que a cartilha do
obscurantismo econômico na América Latina só foi adotada por equipes despreparadas
para enfrentar o desafio.
Houve
também exemplos edificantes de gestão econômica liberal (e sem extremismos
estúpidos) como a do economista Ernan Buchi à frente da economia chilena. Com a
sólida liderança de Buchi que, por sinal, não foi da escola de Chicago, o Chile
conseguiu evitar a armadilha do elevado endividamento externo e da penúria de
receitas cambiais que tanto caracterizou a miséria da região naquela década
perdida. O Brasil, nessa altura, era uma insistente fábrica de péssimos planos
econômicos, baseados em congelamentos de preços, câmbio e poupanças, bastando
recordar os Planos Verão e Collor, na sequência do desastroso Plano
Cruzado.
A
lembrança dessa era de pacotes econômicos é importante para entendermos que
propostas estúpidas têm sempre mais chance de adoção, num processo de
contaminação coletiva entre países, do que a imitação de bons exemplos, até
porque a ilusão dos anúncios de sucesso imediato é uma receita tentadora na
relação entre governantes fracos e governados desesperados.
Um
congelamento de preços, mesmo parcial, como anunciado, na semana passada, pelo
neoliberal presidente Macri, na Argentina, almeja pacificar os argentinos
emparedados na corrida entre preços em alta e rendas e empregos em queda. Mas o
resultado inevitável do controle de preços na Argentina de Macri será o mesmo
desastre de experiências anteriores, pela própria lógica que impõe o rompimento
de uma barragem porosa.
Continuamos
num rumo diferente no Brasil. Não se contempla aqui o controle ostensivo dos
preços. O desabastecimento da população não é um risco, como na vizinha
Argentina. Não nos iludamos, porém, com a capacidade da estupidez humana em
preencher os espaços deixados pela ausência de planos inteligentes e bem
orientados.
O
contágio de lá para cá pode penetrar por baixo de nossas defesas convencionais.
Talvez não penetre pelo descontrole direto do câmbio, como ocorre hoje na
depenada nação-irmã, mas pode se esgueirar pela inflação e pelo custo absurdo
da rolagem da dívida pública brasileira. O vetor da contaminação, no nosso
caso, é o tamanho desmesurado do déficit público. O novo governo apostou todas
as suas fichas numa polêmica reforma do sistema previdenciário, que economizará
(se tudo andar bem) cerca de 1,1 trilhão de reais em dez anos, dos quais apenas
160 bilhões aparecerão nas contas fiscais do presidente Bolsonaro.
Temos
séria desconfiança, para não dizer certeza, de que o tempo útil do atual
mandato presidencial ficará bem aquém dos resultados pretendidos. A insidiosa
dança dos mercados em torno do grau de confiança no taco do primeiro ministro
da economia brasileira pode ser a gota que entornará o caldo do atual
equilíbrio instável em que o País se encontra: PIB muito fraco com inflação
baixa; investimento baixo, embora com juros menos agressivos. Guedes é o
primeiro a apontar, em entrevistas, que andamos na corda bamba.
O
equilíbrio instável em que nos encontramos colabora para manter uma das mais
elevadas taxas de desemprego jamais vistas e com várias economias estaduais
depauperadas pelo largo comprometimento de suas receitas públicas. Tudo
conspira contra o tempo de que o governo federal ainda dispõe para fechar o
ciclo de aprovação de reformas – reformas no plural – no Congresso Nacional.
Mas os parlamentares, em vasta maioria, não se convenceram sobre o papel
crucial do Congresso na virada da economia.
O
tempo restante, no entanto, está quase esgotado. E a assombração do vizinho
arruinado é, cada vez mais, um prenúncio de sofrimentos
repetitivos.
Paulo Rabello de Castro é autor
do Mito do Governo Grátis. Em 1986, foi o primeiro a prever e a escrever sobre
o fracasso inevitável do Plano Cruzado.
Um comentário:
Macri pergunta a Xi Jinping
- Vão investir na Argentina?
E Xi responde:
- Nós somos chinos. Os kamikaze são os japoneses.
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