Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Paulo Rabello de Castro
Páscoa
é passagem, ensina a doutrina cristã, quando nos lembra a passagem da
escravidão para a liberdade (a passagem dos judeus pelo Mar Vermelho, rumo à
terra prometida) ou a passagem da humanidade, da morte para a nova vida (a
ressurreição de Jesus e dos viventes). Por trás de sua beleza poética, a
mensagem da Páscoa nos convoca à reflexão sobre o significado de nossa luta
permanente por ultrapassar barreiras e desafios em nossas vidas terrenas, tendo
como prêmio permanente a libertação de algum tipo de prisão, as asas da
liberdade.
Na
vida comum, também vivemos como prisioneiros. Algumas dessas prisões são
espaços virtuais, que nos constrangem a todos sem discriminar quem, como é
evidente quando somos constrangidos por uma das mais cruéis cargas tributárias
do planeta, vigiados o tempo todo e obrigados a confessar nossas rendas até o
último centavo (este é o mês do imposto!) e abordados pelo Fisco em cada espaço
de nossas vidas, desde quando acendemos a luz de casa, passando pelo caixa do
supermercado, pela farmácia, na empresa, no holerite do salário mensal (capado
quase pela metade pela mais custosa previdência do mundo). Não satisfeito, o
Pantagruel estatal agora cogita de um tributo aplicado sobre qualquer transação
nossa, quem sabe incidindo até sobre o que se faz a portas fechadas.
A
recente virada eleitoral no Brasil nos deu, pela primeira vez, desde a década
de 1960, um governo que se denomina liberal na economia. A palavra contém uma
promessa forte, mas de difícil cumprimento: fazer da vida brasileira um espaço
liberal, com farto oxigênio do progresso, que só as liberdades de iniciativa e
de trabalho podem oferecer, sem deixar ninguém para trás. Portanto, seria essa
a passagem para uma liberdade longamente sonhada pela sociedade. O desafio é
grandioso e não pode ser cobrado, em forma de resultados concretos, antes de um
período razoável de amadurecimento das medidas de liberação da economia. O
problema é que não temos, para o conserto, o mesmo tempo que foi gasto no
aperfeiçoamento da segurança das grades que nos aprisionam há longos anos. É
injusto, mas é assim que funciona: a virada, para ser eficaz, precisa vir a
cavalo, atropelando as grades e os carcereiros, criando novos espaços e não dando,
aos que duvidam e hesitam, tempo para contaminar o ambiente com suas dúvidas e
temores. Moisés não hesitou diante do mar Vermelho. Ou avançava ou pereceria,
ele e o povo que o seguia.
Mais
uma vez, a passagem bíblica nos sugere caminhos para encarar as passagens
mundanas. A páscoa dos novos liberais brasileiros, embora convicta, tem sido
lenta e cheia de mensagens contraditórias ao povo que escuta e tenta entender
seus líderes. Um exemplo banal, mas relevante, está naquilo que melhor
representa o caminho futuro da economia, a lei do Orçamento. Em suas novas
Diretrizes (LDO), o governo conservador-liberal anunciou uma perspectiva de
crescimento da economia que não supera os impasses do passado nem entusiasma
pelo tamanho do salto.
Algum
educado burocrata ficou encarregado de propor um crescimento anual para o País
e veio com uma projeção engessada em cerca de 2% ao ano, até 2022. Modéstia ou
prudência técnica, pouco importa. Quem governa não pode permitir que o discurso
da esperança seja cerceado pelas grades que têm transformado a vida quotidiana
do brasileiro num inferno e, o panorama da nossa economia, num pântano. Crescer
só 2% ao ano é totalmente contraditório com o discurso de uma reforma
previdenciária redentora e trilionária. A nova LDO nos condena a um atoleiro.
Algo
ainda não bate bem nessa conta sobre a eficácia das pretendidas reformas, tanto
a previdenciária quanto as demais, das quais apenas se ouve falar, embora sem a
necessária concretude de ação. Será que nossos profetas de fato creem na
redenção do País por meio das reformas pretendidas? Estarão as reformas de fato
sendo elaboradas de modo a permitir a passagem do povo, hoje escravizado, até
um ambiente de futuras liberdades, a de empreender, a de trabalhar, de poupar,
de progredir? Essas são as reflexões pasqualinas que os novos profetas da
economia estão devendo ao povo sedento de uma mensagem de luz.
Paulo Rabello de Castro é
economista e autor, entre outros, do novo livro REBELDIA E SONHO (Edições de
Janeiro, 2018) em que debate os caminhos para o sonho da liberdade com
crescimento no nosso País.
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