Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Antony P.
Geller
A durabilidade de uma social-democracia
depende, majoritariamente, de dois fatores: tanto a tributação quanto a taxa de
fecundidade têm de ser crescentes.
A tributação tem de ser crescente porque os
gastos sociais são crescentes: como a população está inevitavelmente
envelhecendo — e, com isso, utilizando cada vez mais serviços bancados pelo
estado social-democrata, como saúde e previdência —, um volume cada vez maior
de dinheiro tem de ser arrecadado.
Simultaneamente, para que este maior volume de
dinheiro possa ser arrecadado, é imprescindível que a população tributada
também esteja em crescimento contínuo. Se a população a ser tributada parar de
crescer, a arrecadação tributária irá parar de aumentar.
Na mais benevolente das hipóteses, isto é, se
a população tributada for muito produtiva, a arrecadação até poderá crescer,
mas o fará a um ritmo muito mais lento, o que já bastará para afetar todo
o sistema.
Afinal, se a população continua envelhecendo e
se aposentando a um ritmo crescente (uma inevitabilidade demográfica), mas o
dinheiro necessário para manter seu bem-estar social não está sendo arrecadado
no mesmo ritmo, então temos uma irreversibilidade matemática: faltará dinheiro
para essas pessoas.
A Finlândia já chegou lá
Em 2017, uma reportagem da
Bloomberg já relatava que os políticos e economistas do país
estavam profundamente preocupados com o fato de que não haverá um número
suficiente de pagadores de impostos no futuro para financiar o estado
assistencialista do país. A Finlândia estava vivenciando uma "escassez de
bebês".
Em 2016, o país teve o menor número de partos
em 148 anos — ou desde a grande fome de
1868. A taxa de fecundidade da Finlândia caiu para 1,57 filho por
mulher, e o percentual de pessoas com 20 anos de idade ou menos em relação à
população em idade de trabalhar é de 40%. Era de 60% em 1970. Ou seja, a base
da pirâmide etária encolheu acentuadamente, ao passo que o topo está só
aumentando.
Este percentual de 40% é o menor entre todos
os países nórdicos.
A situação pegou os economistas do país de
surpresa. Eles não só não têm nenhuma solução para isso, como ainda se mostram
um tanto desesperados. Para Heidi Schauman, economista-chefe do Aktia Bank, as
estatísticas são "assustadoras". Como ele próprio explica:
"Essas estatísticas mostram quão rapidamente nossa sociedade está
mudando, e não temos nenhuma solução para evitar esse fenômeno. Temos um
setor público grande e o sistema precisa de pagadores de impostos no
futuro."
Ou seja, o governo finlandês fez promessas que
não tem como serem cumpridas.
E como as coisas evoluíram? Pioraram. As
promessas estão agora inviabilizando a própria existência do estado finlandês.
Eis uma reportagem da Reuters,
de março do presente ano.
O governo de coalizão da Finlândia renunciou na sexta-feira, um mês antes
das eleições gerais,
afirmando que não teria condições de aprovar um pacote de reformas no sistema
de saúde do país, reforma esta que é tida como crucial para garantir a
solvência fiscal do governo.
E o autor da reportagem prossegue falando
sobre o inevitável.
Os sistemas de saúde ao redor de boa parte do mundo desenvolvido estão
sob crescente pressão financeira: as pessoas estão vivendo mais e os custos dos
tratamentos estão disparando, ao mesmo tempo em que há menos trabalhadores para
bancar um crescente numero de aposentados e pensionistas.
Por cinco décadas (as sociais-democracias
nórdicas começaram efetivamente no
final da década de 1960), os progressistas louvaram os estados de
bem-estar social nórdicos (convenientemente ignorando outros aspectos). Mas
agora a conta chegou.
Os países nórdicos, nos quais um abrangente estado de bem-estar é a base
de todo o modelo social, estão entre os mais afetados.
Foi prometida uma reforma. Mas ela não foi
aprovada. A carteira está ficando vazia.
Mas a reforma foi tida como controversa e, na
Finlândia, planos para cortar custos e aumentar a eficiência estão parados há
anos.
"O retrato que eu recebi das forças políticas no parlamento nos
últimos dias me forçaram a tirar conclusões. Não há saída. Estou extremamente desapontado",
disse aos jornalistas o primeiro-ministro Juha Sipila, do Partido do
Centro, em uma entrevista coletiva.
Eis um grito de desespero. Tradução:
"Precisamos das reformas já! Não há alternativa para a Finlândia".
Estamos esperando. Os eleitores finlandeses também.
O governo tinha como objetivo reduzir
dramaticamente o aumento dos gastos com o sistema de saúde na próxima década,
reduzindo o orçamento para € 18,3 bilhões em 2029 contra uma estimativa inicial
de € 21,3 bilhões.
As reformas iriam gerar uma economia porque
criariam 18 novas regiões para organizar os serviços de saúde em vez das 200
entidades que atualmente são as responsáveis.
Críticos disseram que a escala da economia projetada não era realista.
É possível ver para onde tudo isso leva:
calote.
Não, o governo não irá calotear sua dívida.
Nenhum governo é insano ao ponto de atacar exatamente as pessoas (investidores)
lhe mantêm funcionando. "Calote", no caso, significa que o governo
irá mudar as regras anteriormente acordadas. Ele irá aumentar a idade mínima
tanto para se aposentar quanto para se poder usar os serviços
"gratuitos" de saúde. Irá também diminuir repasses e auxílios.
Inevitável.
Outros países nórdicos também já tiveram de
lidar com a necessidade de cortar custos.
A Suécia está gradualmente aumentando a idade
mínima para se aposentar, e abriu várias partes do seu sistema de saúde para o
setor privado em uma tentativa de aumentar a eficiência.
A Dinamarca irá gradualmente aumentar a idade
de aposentadoria para 73 anos — a maior do mundo — ao mesmo tempo em que está
reduzindo impostos, benefícios e o valor do seguro-desemprego, para estimular
as pessoas a trabalharem mais.
O problema tem sido particularmente mais grave
na Finlândia, onde a crise financeira de 2008-09 amplificou os efeitos das
mudanças demográficas, como uma taxa de fecundidade em acelerado declínio.
Vários governos finlandeses já tentaram fazer vários e diferentes tipos
de reformas no sistema de saúde nos últimos 12 anos. Todos fracassaram.
Observe que há um padrão.
1. Promessas demagógicas.
2. Taxa de fecundidade em declínio
3. Aumento da expectativa de vida.
4. Déficits orçamentários do governo (gastos
maiores que as receitas).
5. Promessas de reformas que nunca se
concretizam.
6. Mais promessas.
Dizer o quê? Se eleitores querem promessas,
então, como supostamenteteria
dito Maria Antonieta, "que comam promessas!".
Será generalizado
Leva um tempo para o cenário estatisticamente
inevitável se concretize. Mas irá se concretizar. Em todo o mundo
ocidental.
Idades mínimas para aposentadoria irão subir
continuamente. As prometidas aposentadorias e pensões serão continuamente
reduzidas. Gastos com saúde e educação serão cortados. Haverá vários tipos de
imposição burocrática (uma forma de racionamento) para se utilizar os serviços
estatais de saúde. Remédios deixarão de ser subsidiados. Vários repasses
assistenciais serão cortados, o que inclui subsídios agrícolas e empresariais.
Haverá uma busca por culpados quando este
calote — sim, é uma forma de calote — ocorrer.
E, em última instância, a menos que haja uma
explosão demográfica, nenhuma reforma que não passe pela contínua elevação na
idade mínima para se aposentar e nos cortes de benefícios assistenciais será
capaz de manter todo o arranjo de seguridade social bancada pelo estado
funcionando.
Esta é uma forma sutil de calote. Mas é um
calote. Os países nórdicos já começaram a calotear. Já estava na hora.
A fé pagã
Os modelos de estado de bem-estar foram criados majoritariamente na década de
1960, uma época em que se imaginava que a pirâmide etária sempre
seria gorda na base (muitas crianças e jovens) e fina no topo (poucos idosos).
Sob esse arranjo, imaginou-se que sempre
haveria relativamente poucos idosos (que recebem dinheiro da Previdência e da Seguridade
Social), muitos trabalhadores (também conhecidos como "pagadores de
impostos") e várias crianças (futuros pagadores de impostos).
Naquele mundo, um estado de bem-estar, embora não fosse uma boa ideia
economicamente, ao menos era matematicamente sustentável.
Hoje, em contraste, esse mesmo arranjo já se
tornou problemático, pois estamos vivendo mais e tendo menos filhos. Uma fatia
crescente de idosos significa mais gastos governamentais com previdência, saúde
e vários outros subsídios (como remédios), ao passo que uma fatia decrescente
de crianças significa menos futuros pagadores de impostos para bancar todo esse
gasto com a seguridade social.
Consequentemente, todo o arranjo social-democrata
está sem sustentação. A tendência mundial é uma crise fiscal de estilo grego.
Milhões de ocidentais irão descobrir, ao
envelhecerem, que depositaram sua fé em um deus falso: o moderno estado
social-democrata. Esse deus irá calotear.
As promessas dos políticos, em algum momento,
irão se revelar desconectadas da realidade fiscal. Haverá calotes universais em
vários programas assistenciais. Isso tenderá a solapar a confiança nos
governos. Irá também acabar com a legitimidade deles perante os eleitores.
"Mas vocês prometeram!", dirão os
eleitores. "Desculpe, calculamos mal", dirão os políticos em
resposta.
Na Finlândia, isso já começou. No resto do
mundo ocidental, é questão de tempo.
Antony P. Geller é formado
em economia pela Universidade de Illinois, possui mestrado pela Columbia
University em Nova York e é Chartered
Financial Analyst credenciado pelo CFA Institute. Originalmente publicado no
site Mises Brasil em 24 de julho de 2019.
2 comentários:
Extremamente lúcido. É necessário que essa constatação seja divulgada para evitar ou, pelo menos, alertar para o surgimento dos magos que prometem novos mundos sem os necessários fundos (recursos) para a materialização de suas promessas (ou premissas?). A realidade futura, às vezes, se apresenta como ficção. Por isso, "é melhor prevenir do que remediar", como bem ensina a sabedoria popular que ora anda esquecida.
"Escassez de bebês" significa excesso de abortos feitos legalmente. A maldição desse genocídio está chegando. Essas pessoas não quiseram ter o trabalho de criar filhos; por isso, serão eutanasiados pelos seus poucos descendentes.
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