Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Luiz Antônio
P.Vale
Eu já
escrevi que o grande jogo mundial foi feito para se jogar. Este é seu propósito
e razão de existir. Não é para amadores. Mesmo quem não o compreende, quem não
sabe jogar, acaba jogando ainda que de forma inconsciente, conduzido. A omissão
é uma ação ou decisão em si, devidamente respaldada pelo livre arbítrio. O
mesmo raciocínio se aplica as “famílias”, nações e blocos.
O xadrez é
um jogo interessante onde são admitidos apenas dois jogadores, ou se está de um
lado ou do outro, num tabuleiro de 64 casas, alternando de forma dual brancas e
pretas, onde o objetivo é deixar o “Rei” do adversário sob ameaça de captura,
sem alternativa de fuga ou confronto, impondo-lhe a rendição incondicional
através do xeque-mate.
O jogo
global vem sendo jogado há muitos milênios, mas nos últimos séculos tomou
contornos mais específicos, e nos últimos 70 anos vem se definindo. Não existe
dois ganhadores na lógica dos protagonistas, existe o xeque-mate. Faz-se
necessário quebrar paradigmas para entendê-lo. Aqui em terras tupiniquins se
mexe um peão por vez no tabuleiro, lá eles movem o bispo, o cavalo e a rainha
simultaneamente. As regras são outras. Não existe paixão, existe o jogo.
As grandes
“peças” deste jogo movem-se em função de três variáveis: a economia (controle
da distribuição ou acumulo de riqueza), a militar (capacidade de emprego do
poder armado para impor sua vontade) e o sistema de crenças (religiões, doutrinas
e percepções mentais que constroem a concepção de “mundo”, propiciando a
interpretação do “certo e errado”, etc...). A dinâmica do jogo acompanha estes
três eixos, em grande parte das vezes nesta ordem, mas não necessariamente.
Nosso foco
neste artigo será a economia, por isso será tratada por último. Os dois outros
eixos receberão apenas uma apreciação sucinta, tendo sido mais extensamente
abordados em outros artigos por mim já escritos.
Vamos
começar de trás para a frente. No eixo do sistema de crenças o comportamento
humano baseia-se, em última instância, naquilo que ele acredita. A realidade é
a ilusão na qual ele deposita fé. Por isso antes da ação deve-se conquistar
“corações e mente”. Num mundo em transformação o que era verdade hoje amanhã já
não o é. As peças do tabuleiro, antes bem posicionadas e fortemente enraizadas
para garantir que a estratégia de um jogador funcione, foram caindo e ficando
pelo caminho, conforme o outro participante se fortaleceu e aprendeu o jogo.
Dois
exemplos desta situação são a queda do Cardeal George Pell e do bilionário
Jeffrey Epstein, ambos envolvidos em escândalos financeiros e casos de abuso
sexual. São bem conhecidas nos grupos internos as redes de pedofilia e abuso
sexual existentes e operantes há séculos em elevados círculos de poder, mas
eram intocáveis até poucos anos atrás. O mesmo acontece com Organizações
Criminosas apoiadas em parceiros financeiramente robustos e poderosos.
Em 17 de
junho autoridades estadunidenses apreenderam, de um navio (MSC Gayane) no porto
de Filadélfia, 15,8 toneladas de cocaína, tornando-se o maior carregamento
flagrado na história da Alfândega dos EUA. Eles estimam o valor das drogas em
US$ 1,1 bilhão. O navio foi financiado para a MSC pelo grupo JP Morgan. Em
fevereiro, agentes alfandegários já tinham apreendido 1,6 tonelada de cocaína
em outro navio, o Carlotta, também da MSC, ao entrar no porto de Newark. Este
não é um negócio para gente pequena. Imagina “lavar” US$ 1,1 bilhão de um único
carregamento? À medida que mais informações forem disponibilizadas ao público
sobre várias “verdades” hoje tidas como cláusula pétrea, visões e conceitos
estratificados de como o mundo funciona serão forçosamente revistos, deixando
as pessoas atônitas.
No eixo
militar a movimentação é visível na mídia. O aparato do Complexo Industrial
Militar precisa de dinheiro para se financiar e qualquer ameaça ao fluxo de
recursos precisa ser imediatamente eliminada. As regiões de conflitos,
potenciais e em andamento, que existem hoje no Iêmen, na Ucrânia, no Iraque, no
Afeganistão, na Síria, na Coréia do Norte, no mar do sul da China e no Irã
consomem, e consumirão, uma enorme quantidade de recursos financeiros.
Algumas
peças no tabuleiro, percebendo a dinâmica do jogo, já estão reavaliando o lado
em que querem estar, como é o caso da Turquia (2º maior exército da OTAN) que
adquiriu recentemente o sistema russo SS-400 de proteção antiaérea, mesmo a
custa de sua expulsão do projeto do caça furtivo de quinta geração
norte-americano F-35 Joint Strike Fighter. As primeiras partes do sistema foram
descarregadas de um avião russo no aeroporto de Murted, conhecido como Base
Aérea Akinci, perto de Ancara, na Turquia, em 12 de julho de 2019.
Em 1º de
julho o mundo esteve a beira de uma hecatombe quando um submarino nuclear russo
de “pesquisa” Vladikavkaz, da classe Losharik (Projeto 10831), que trabalha em águas
de até 6 mil metros de profundidade mapeando cabos de comunicação (dentre
outras coisas), e que hipoteticamente é transportado e escoltado por outro
submarino nuclear maior BS-64 Podmoskovye, teve um incêndio de “causa
desconhecida”, vitimando 14 membros de sua tripulação, quando navegava submerso
no Mar Báltico.
O episódio
deixou a todos em extrema tensão, uma vez que poderia ter sido interpretado
como um ataque dos submarinos da OTAN que faziam exercícios navais nas
proximidades, provocando reuniões de emergência em Moscou e Washington. Uma
falha de comunicação e a 3ª guerra mundial teria começado. Aliás, em março
foram divulgadas informações pelo analista David Ochmanek, de que em todas as
simulações de guerra feitas pela Rand Corporation, os EUA sempre perdem num
confronto direto com a Rússia e China juntas. Isto tem elevado o grau de
preocupação.
Com o envio
de tropas estadunidenses e seus aliados para as zonas de conflito, seguidas de
repetidos exercícios militares, as chances de um mal-entendido gerarem um
ataque de qualquer das partes aumentaram exponencialmente, dando a sensação que
todos estão se preparando para um conflito que, a cada dia, parece mais
provável. A retórica belicista do Presidente Trump não contribui para mitigar a
tensão. No eixo militar, bem como nas Atividades de Inteligência Estratégica, o
Brasil perdeu significativamente a expressão a nível mundial frente aos grandes
predadores militares globais, tendo sua relevância adstrita a América do Sul.
Antes de
irmos ao último ponto importa frisar que o tabuleiro, sentindo a elevação da
pressão na superfície, também tem apresentado tremores, todavia bastante
diferentes dos da Sra. Angela Merkel da Alemanha.
Segundo
Michael Snyder, de 07 a 14 de julho nosso planeta experimentou uma média de
mais de 677 terremotos de magnitude 1,5 ou maior por dia. Isso denota que o
número de terremotos globais agora é mais de três vezes acima do normal. Isto
posto, o que tem chamado a atenção é que alguns deles, notadamente os de maior
magnitude, quando analisada sua assinatura sismográfica, têm apresentado um
padrão anormal que destoa dos terremotos naturais. Investigações em curso levam
a vários cenários, sem poder ser descartada a hipótese Akademik Lomonosov,
dentre outras.
Por fim no
primeiro eixo temos a economia. Obter e usufruir da riqueza sempre foi um
desejo humano e uma forma de controle, extremamente movida pelo Ego e aquecida
pela vaidade. Nesta área é fundamental, como no xadrez, entender o movimento e
antecipar-se a ele. Aqueles que estudam
economia, ou por ela se interessam, sabem que grande parte do valor de certos
ativos deve-se a percepções e expectativas, notadamente os ativos especulativos.
O mercado
de crédito, sejam títulos da dívida ou mercado imobiliário, tem seu componente
especulativo. Neste mister não é novidade que enormes bancos, como o HSBC antes
e o Deutsche Bank este mês, tem passado por grandes dificuldades, fora bancos
menores. Para não nos alongarmos na análise técnica do espectro maior cabe
citar, de forma breve, que o estrategista de câmbio do Deutsche Bank, Robin
Winkler, escreveu que “a tensão cíclica nos desequilíbrios financeiros globais
atingiu níveis vistos pela última vez na véspera da crise financeira”
(referindo-se a histórica quebra pela falta de liquidez em 2008 do Lehman
Brother, o que deu início a “grande crise”).
Winkler
avisa que um sinal de alerta a ser observado é que a correlação entre as taxas
de juros reais e os desequilíbrios em conta corrente é tão alta quanto nos
picos anteriores à crise. Fundos de investimento, como o RenTec, de James
Simons, principalmente hedge funds, iniciaram uma “corrida bancária” de saques
que culminou com cerca de US$ 1 bilhão retirados por dia em meados deste mês.
Para
perceber os movimentos no tabuleiro podemos olhar, além dos experts do mercado
como Fundos de Investimento com suas “inside information”, para o que as nações
bem informadas estão fazendo.
Dispondo de
agências de inteligência que coletam, analisam e produzem conhecimento
maciçamente, verificamos que as principais nações do planeta estão se movendo
rapidamente. O que pudemos constatar é que a China e Rússia já vem a alguns
anos adquirindo ouro de forma relevante.
A compra de
ouro dos bancos centrais nos primeiros cinco meses deste ano é 73% maior do que
um ano antes, com a Turquia e o Cazaquistão também se unindo a China e a Rússia
como os quatro maiores compradores. É possível constatar que 2018 foi o ano em
que bancos nacionais / centrais adquiriram mais ouro desde 1968 e estes volumes
atuais estão ultrapassando o volume do ano passado em 73%, tornando possível,
se a tendência continuar, prever que 2019 será o maior ano para aquisições de
ouro na história.
Em outro
movimento, que acredito sincronizado, lemos que a participação do dólar nas
reservas internacionais globais atingiu seu mínimo em 20 anos, como informa o
último relatório do Banco Central Europeu (BCE). Segundo a mesma fonte em 2018 a
participação do dólar nas reservas dos bancos centrais em todo o mundo foi de
apenas 61,7% – um mínimo histórico desde a criação da União Econômica e
Monetária da UE em 1999.
Por
exemplo, em apenas um ano (de abril de 2018 a abril de 2019), Moscou vendeu
cerca de 87% dos seus títulos do Tesouro dos EUA e ficou fora da lista dos 30
maiores detentores de dívida pública estadunidense publicada pelo Departamento
do Tesouro dos EUA. As informações do Departamento do Tesouro dos EUA revelaram
uma tendência nova e bastante preocupante para os EUA: mesmo os aliados mais
próximos dos EUA estão se desfazendo dos títulos da dívida pública deles. Por
exemplo, em abril de 2019, o Reino Unido liderou o rol dos maiores vendedores
dos títulos estadunidenses, tirando do seu portfolio títulos no valor de US$
16,3 bilhões. O Japão, o segundo maior credor dos estadunidenses, também vendeu
títulos no valor de US$ 11,07 bilhões.
A crise no
sistema financeiro internacional, ou algum tipo de mudança radical, não parece
ser mais uma questão de “se” vai acontecer, mas de “quando”. Pessoas bem
informadas apostam que será ainda no 2º semestre de 2019, ou no máximo, na
primeira metade de 2020. E o Brasil, como está se movimentando?
Segundo
dados do Bacen em maio de 2019 o Brasil possuía reservas US$ 388,09 bilhões, o
que vem se mantendo em patamar semelhante a sete anos consecutivos, uma vez que
em maio de 2012 nossas reservas eram de US$ 373,91 bilhões. Esta reserva atual
é considerada por muitos economistas como elevada e confortável, uma vez que se
considerarmos o PIB brasileiro, dá uma sensação de segurança em função do seu
montante. Entretanto, além de quantidade deve ser considerada a qualidade dos
ativos, vez que poderíamos vê-la como segura, não fosse pela natureza da sua
composição.
Surpreendentemente
destes US$ 388,09 bilhões temos US$ 363,32 bilhões em títulos e somente US$
7,98 bilhões em moedas estrangeiras, ou seja, 93,62% das nossas reservas são
títulos, o que é uma exposição muito acima dos demais países! Não bastasse a
vulnerabilidade óbvia é um péssimo negócio financeiro, pois em 2018 pagamos, em
média, 9,5% a.a. sobre os títulos brasileiros que financiam a dívida pública,
emitidos para 5 anos, e recebemos 3% a.a pelos títulos norte-americanos que
compramos, emitidos para o mesmo prazo.
Não parece
uma troca razoável, tendo alguns economistas que ainda dizem com orgulho que
está bom, pois a diferença de spread antes já chegou a 15%. Agora façam as
contas deste percentual sobre o montante dos títulos. Um país endividado como o
Brasil não pode se dar ao luxo de ignorar isto. Trabalhamos para pagar juros.
Para deixar
mais clara a frágil situação, que contrária a estratégia dos demais países que
mostrei, a participação do ouro nas reservas brasileiras é de insignificantes
US$ 3,05 bilhões, ou seja, 0,79% do total. A valorização do ouro, que foi de
35,40% nos dois últimos anos (cotação até maio), não tem sido algo desprezível
se comparado ao que recebemos pelos títulos, mas o mais importante agora é a
segurança, como todos os países em tempo instáveis tem buscado. Teríamos
rentabilidade e segurança.
Fica
absolutamente cristalino que, quando vier a crise, o Brasil terá que rezar
muito para a credibilidade e confiança dos emissores dos títulos,
principalmente os Estados Unidos, estarem em alta, do contrário nossas reservas
lastreadas majoritariamente em títulos serão transformadas em mico. Neste
cenário a situação será de caos total. Toda a nossa segurança econômica está
calcada numa percepção de confiança que gere credibilidade a aquele que nos
deve, e não em ativos reais com liquidez garantida como o ouro! É uma aposta
alta e muito arriscada para quem administra ativos e tem nas mãos a segurança
econômica de um país.
As pessoas
que governam uma nação não podem se comportar como um turista na praia que, por
falta de preparo adequado, fica inerte ao ver a água do mar recuar e uma sombra
enorme se formar no horizonte. China, Rússia, Índia, União Europeia, EUA,
Japão, enfim, todos os países bem informados estão flexionando seus músculos e
protegendo seus cofres. Sabem o que vem por aí. Observam e mapeiam o que está
no fundo do mar e na órbita baixa, antecipando-se e protegendo seus interesses.
Desde a
morte de James Vincent Forrestal em 22 de maio de 1949, quando a fratura e o último
capítulo começou, até o dia primeiro de outubro, quando espera-se que o General
Mark Milley se tornará presidente do Joint Chiefs of Staff dos EUA, passou-se
um longo tempo.
Aqui, já
são 33 (trinta e três) anos que vemos o Brasil num processo lento e angustiante
de deterioração, como gado sendo levado para o abate.
Estamos num
mundo conturbado, em severa mutação, cujas consequências vão remodelar as
relações de poder de forma dramática. As decisões, ou falta delas, vão
repercutir de forma enfática no futuro da nação, podendo mudar totalmente o
país como hoje o conhecemos.
Todo jogo
acaba ou muda de fase. O xeque-mate se aproxima.
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