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Por Fábio Chazyn
Capitulo X: “O que é Futuro?” – Parte
II
Parece que
as pessoas engolem fácil qualquer conceito-de-esquina, como “as pessoas só se
mexem quando mexem no bolso delas”.
Como dizem
os americanos, ‘bull-shit’! Ou seja, isso é besteira!
É verdade
que a gente pensa no nosso próprio interesse, o que é legítimo porque, afinal,
todo mundo tem um estoque de sonhos e compromissos a realizar. E o dinheiro
certamente pode ajudar.
Mas somos
feitos de outras coisas também. Quem nunca vibrou num jogo da nossa seleção ou
nunca se indignou presenciando uma criança sendo maltratada? Essas coisas não
mexem no nosso bolso, mas mexem muito no nosso espírito.
Nos
encantamos vendo que fazemos parte de coisas maiores do que nós mesmos, como
indivíduos. Quando planejamos em conjunto e lutamos em conjunto, a vitória tem
mais gosto. Quando trazemos o título do time p’ra casa, ou quando nossos
queridos realizam feitos, parece que nos alegra tanto ou até mais do que as
nossas próprias conquistas.
Quando
jovens procuramos promover o que nos traz prazer. Com o tempo vamos aprendendo
o prazer de cooperar. Aprendemos que, em grupo, podemos viver melhor. Ao longo
dos tempos, os grupos foram evoluindo de clãs e tribos até chegar no Estado.
Se, no processo, a realidade física de cada um condicionou os diferentes modos
de vida, as regras básicas da convivência no seio de cada um não mudaram. A
lealdade sempre foi, e continuará sendo, a premissa básica para a continuidade
das sociedades.
De fato,
sem a confiança no grupo não teríamos evoluído. A lealdade foi o fio condutor
desde os grupos ‘naturais’, sob autoridade informal, passando pelos tempos do
‘Direito Divino’ das dinastias, até chegar nos dias em que o ‘Pacto Social’
constitui o Estado-Nação sob a proteção de governos transitórios.
Enquanto o
Pacto Social versa sobre o que temos que fazer, o governo se preocupa com o como
fazer as coisas que temos que fazer para realizar o máximo de satisfação na
comunidade.
O Pacto
Social, ou a Carta Magna ou ainda a Constituição de uma Nação, são os nomes
dados às ferramentas que o Estado coloca à disposição dos governos, como a
estrutura de funcionamento da
autoridade, mas sobretudo oficializa a obrigação da prevalência do caráter de
lealdade nas relações de convivência dos cidadãos, independentemente do poder
atribuído ou conquistado de cada um. Daí a necessidade da Constituição de
promover a lealdade e o patriotismo.
A
importância dessa exaltação fala por si própria nos casos emblemáticos dos
grupos de maior coesão, como entre os muçulmanos e sua ‘religião-política’ ou
entre os americanos. Se os primeiros professam a leitura do seu pacto social, o
Corão, pelo menos 5 vezes por dia, no caso dos Estados Unidos, é um obrigatório
cotidiano para TODAS as idades jurar devoção e lealdade para com a nação,
“mantendo-a indivisível com liberdade e justiça para todos”, através da
veneração de sua bandeira, a representação concreta desses valores.
O projeto
dos americanos teve sucesso. A Constituição deles está completando dos 232 anos
de idade. Essa longevidade está associada ao fato de ter somente 5 folhas, com
7 artigos sobre a estrutura do Estado e 27 emendas sobre os direitos e
obrigações dos cidadãos.
O projeto
dos brasileiros não tem tido a mesma sorte. Desde a independência, há 197 anos,
já tivemos 7 Constituições. A última, de 1988, mostrou que não conseguiu evitar
a deslealdade da usurpação dos poderes da República por maus patriotas. Vamos
ter que revisitar nosso Pacto Social para evitar a desintegração da sociedade
brasileira, já em processo acelerado.
Já tarda a
elaboração de um Projeto Estratégico de Nação que tem que ser a base dos
trabalhos dos próximos Constituintes. Sem esse Projeto Estratégico de Nação
corre-se o risco de repetir-se a tragédia da nossa Constituição Federal de 1988
que nasceu como a Constituição-Cidadã e está morrendo como a Constituição-Vilã
afogada no mar dos seus 250 artigos, mais 100 Disposições Transitórias e outras
mais de 100 emendas.
O Projeto
Estratégico de Nação tem que dissecar assuntos polêmicos, confrontar as opiniões,
ponderá-las e pacificá-las. Com calor, mas sem dor.
Armamento
da população, o Estado como provedor da educação, da saúde e da segurança da
sociedade, autodeterminação sexual, descriminalização de drogas, modelo
eleitoral, modelo federativo, pena de morte, serviço comunitário, o papel
social e econômico do idoso, a prioridade da criança, a propriedade da água e
da energia, o direito à prosperidade.
Todos esses
temas, e outros tantos, com as opiniões dos Constituintes, notórios
representantes da sabedoria da sociedade, não podem se confinar nos gabinetes
para depois se enfiar goela abaixo dos que são os mais interessados. Têm que
ser expostos pelas mídias televisiva e digital à apreciação de todos os
cidadãos que, via referendo popular, têm que poder expressar suas preferências.
Para ser
longeva, a nova Carta Magna tem que começar com bons conceitos e se concentrar
nos princípios. Em vista da tecnologia dos tempos modernos, ela poderá dar luz
ao que outrora se pensava ser utopia. Ela poderá promover a
democracia-participativa ensejando os meios para os cidadãos tutelarem o seu
próprio futuro.
É o enterro
do “deixa-comigo-que-eu-quebro-teu-galho” dos “gênios-populistas-mau-caráter”
que gostam de repetir que o povo brasileiro só pode ter liberdade quando souber
usá-la; uma besteira equivalente a dizer que “um sujeito não pode entrar na
água antes de saber nadar” ou que “o brasileiro só se mexe quando mexem no
bolso dele”, com a intenção de desqualificar o seu espírito de coletividade, de
cidadania.
Chega de
manipulação para manter o brasileiro na ignorância e o Brasil no
subdesenvolvimento. Isso é coisa de colonialista burro que come galinha dos
ovos-de-ouro.
Agora é a
hora da virada. A hora de fazer do limão, uma limonada.
A hora de
fazer do presente, o começo do futuro!
Fabio Chazyn, empresário, engenheiro,
cientista político, mestre em história econômica pela London School of
Economics e escultor. Autor do livro: “Consumo Já!” – Por um Novo Itamaraty
(2019) - fchazyn@chazyn.com
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