Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por J. R.
Guzzo
“Caros amigos
Desde ontem, 15/10/19, não sou
mais colaborador da revista “Veja”, na qual entrei em 1968, quando da sua
fundação, e onde mantinha uma coluna quinzenal desde fevereiro de 2008. A
primeira foi publicada na edição de 13/02/2008. A partir daí a coluna não deixou
de sair em nenhuma das quinzenas para as quais estava programada.
Na última edição, com data de
16/10/19, a revista decidiu não publicar a coluna que eu havia escrito. O
artigo era sobre o STF, e sustentava, como ponto central, que só o calendário
poderia melhorar a qualidade do tribunal — já que, com a passagem do tempo,
cada um dos 11 ministros completaria os 75 anos de idade e teria de ir para
casa. Supondo-se que será impossível nomear ministros piores que os destinados
a sair nos próximos três ou quatro anos, a coluna chegava à conclusão que o STF
tende a melhorar.
A liberdade de imprensa tem duas
mãos. Em uma delas, qualquer cidadão é livre para escrever o que quiser. Na
outra, nenhum veículo tem a obrigação de publicar o que não quer. Ao recusar a
publicação da coluna mencionada acima, “Veja” exerceu o seu direito de não
levar a público algo que não quer ver impresso em suas páginas. A partir daí,
em todo caso, o prosseguimento da colaboração ficou inviável.
Ouvimos, desde crianças, que não
há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe. Espero que esta coluna
tenha sido um bem que não durou, e não um mal que enfim acabou. Muito
obrigado.”
O ARTIGO NÃO PUBLICADO:
…são os onze ministros que
formam a nossa “corte suprema”, e não podem ser demitidos nunca de seus cargos,
nem que matem, fritem e comam a própria mãe no plenário. Só há uma maneira da
população se livrar legalmente deles: esperar que completem 75 anos de idade.
Aí, em compensação, não podem ser salvos nem por seus próprios decretos. Têm de
ir embora, no ato, e não podem voltar nunca mais. Glória a Deus…
Um dos grandes amigos do Brasil
e dos brasileiros de hoje é o calendário. Só ele, e mais nenhum outro
instrumento à disposição da República, pode resolver um problema que jamais
deveria ter se transformado em problema, pois sua função é justamente resolver
problemas – o Supremo Tribunal Federal. O STF deu um cavalo de pau nos seus
deveres e, com isso, conseguiu promover a si próprio à condição de calamidade
pública, como essas que são trazidas por enchentes, vendavais ou terremotos de
primeira linha. Aberrações malignas da natureza, como todo mundo sabe, podem
ser resolvidas pela ação do Corpo de Bombeiros e demais serviços de salvamento.
Mas o STF é outro bicho. Ali a
chuva não para de cair, o vento não para de soprar e a terra não para de tremer
– não enquanto os indivíduos que fabricam essas desgraças continuarem em ação.
Eles são os onze ministros que formam a nossa “corte suprema”, e não podem ser
demitidos nunca de seus cargos, nem que matem, fritem e comam a própria mãe no
plenário. Só há uma maneira da população se livrar legalmente deles: esperar
que completem 75 anos de idade. Aí, em compensação, não podem ser salvos nem
por seus próprios decretos. Têm de ir embora, no ato, e não podem voltar nunca
mais. Glória a Deus.
Demora? Demora, sem dúvida, e
muita coisa realmente ruim pode acontecer enquanto o tempo não passa, mas há
duas considerações básicas a se fazer antes de abandonar a alma ao desespero a
cada vez que se reúne a apavorante “Segunda Turma” do STF – o símbolo, hoje, da
maioria de ministros que transformou o Supremo, possivelmente, no pior tribunal
superior em funcionamento em todo o mundo civilizado e em toda a nossa
história. A primeira consideração é que não se pode eliminar o STF sem um golpe
de Estado, e isso não é uma opção válida dos pontos de vista político, moral ou
prático. A segunda é que o calendário não para. Anda na base das 24 horas a
cada dia e dos 365 dias a cada ano, é verdade, mas não há força neste mundo
capaz de impedir que ele continue a andar. Levará embora para sempre, um dia,
Gilmar Mendes, Antônio Toffoli, Ricardo Lewandovski. Antes deles, já em
novembro do ano que vem e em julho de 2021, irão para casa Celso Mello e Marco
Aurélio – será a maior contribuição que terão dado ao país desde sua entrada no
serviço público, como acontecerá no caso dos colegas citados acima. E assim, um
por um, todos irão embora – os bons, os ruins e os horríveis.
Não estará sujeito, como
acontece hoje, à ditadura de um STF que inventa leis, censura órgãos de
imprensa e assina despachos em favor de seus próprios membros. Se tiver mais do
que isso, ainda pode pegar um bom período longe do pesadelo de insegurança,
desordem e injustiça que existe hoje. Só não há jeito, mesmo, para quem já está
na sala de espera da vida, aguardando a chamada para o último voo. Para estes,
paciência.
Faz diferença, é claro. Só os
dois que irão para a rua a curto prazo já ajudam a mudar o equilíbrio
aritmético entre o pouco de bom e o muitíssimo de ruim que existe hoje no
tribunal. Como é praticamente impossível que sejam nomeados dois ministros
piores do que eles, o resultado é uma soma no polo positivo e uma subtração no
polo negativo – o que vai acabar influindo na formação da maioria nas votações
em plenário e nas “turmas”. Com mais algum tempo, em maio de 2023, o Brasil se
livra de Lewandowski. A menos que o presidente da época seja Lula, ou coisa
parecida, o ministro a ser nomeado para seu lugar tende a ser o seu exato
contrário – e o STF, enfim, estará com uma cara bem diferente da que tem hoje.
O fato, em suma, é que o calendário não perdoa. O ministro Gilmar Mendes pode,
por exemplo, proibir que o filho do presidente da República seja investigado
criminalmente, ou que provas ilegais, obtidas através da prática de crime,
sejam válidas numa corte de justiça. Mas não pode obrigar ninguém a fazer
aniversário por ele. Gilmar e os seus colegas podem rasgar a Constituição todos
os dias, mas não podem fugir da velhice.
O Brasil que vem aí à frente, por
esse único fato, será um país melhor. Se você tem menos de 25 ou 30 anos de
idade, pode ter certeza de que vai viver numa sociedade com outro conceito do
que é justiça. Não estará sujeito, como acontece hoje, à ditadura de um STF que
inventa leis, censura órgãos de imprensa e assina despachos em favor de seus
próprios membros. Se tiver mais do que isso, ainda pode pegar um bom período
longe do pesadelo de insegurança, desordem e injustiça que existe hoje.
Só não há jeito, mesmo, para
quem já está na sala de espera da vida, aguardando a chamada para o último voo.
Para estes, paciência. (Poderiam contar, no papel, com o Senado – o único
instrumento capaz de encurtar a espera, já que só ele tem o poder de decretar o
impeachment de ministros do STF. Mas isso não vai acontecer nunca; o Senado
brasileiro é algo geneticamente programado para fazer o mal). Para a maioria, a
vitória virá com a passagem do tempo.
JR GUZZO é Jornalista.
4 comentários:
Agora só sobrou o A.N (que "virou" um sanatório geral).
No ano de 2014 eu postei este vídeo, parodiando que Augusto Nunes seria o ultimo "marinheiro" que sobraria.
https://www.youtube.com/watch?v=fMqJZZeZxmM
O vídeo (semelhante a este) que eu postei, eles censuraram (fizeram o Youtube excluir); aos 3:20 do vídeo: "Veja ..... ela não tem tripulação .... ela não tem vida..."
O guzzo tem um textonexcelente, cortant3 e colocou a real impressão que a maioria dos brasileiros tem do supremo. A análise da chegada da idade dos nossos juízes da mais alta corte traz uma leveza, um humor e um toque de dramaticidade impressionante. Aplausos
A revista Veja deu um tiro no pé ao censurar o artigo. Tenho certeza que ele, o artigo, atingiu mais leitores do que se fosse publicado na revista. Ainda bem que o jornalista não se vendeu e abandonou aquele "time de vermelhos".
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