Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Euro
Bento Maciel Filho
Entra ano, sai ano, e, depois de
cada feriado festivo nacional, Natal, Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia das
Crianças, Páscoa, Carnaval, entre outros, sempre se tem notícia de que um
determinado percentual do total de presos que obteve o direito da chamada
“saída temporária” não retornou às celas. Nesses momentos, invariavelmente,
paladinos da Justiça levantam suas vozes – e microfones – não só para criticar
a ação dos juízes e achincalhar a nossa Lei de Execução Penal (LEP), como
também para propor o imediato “fim” daquele benefício.
Mas afinal, o que é a chamada
“saída temporária”?
Inicialmente, é importante
mencionar que, de acordo com a nossa LEP, duas são as formas pelas quais, no
curso do cumprimento da pena privativa de liberdade, um determinado detento
pode sair, momentaneamente, do estabelecimento carcerário: a-) permissão de
saída; e b-) saída temporária.
A primeira, prevista no artigo
120 da LEP, é aplicada aos detentos que cumprem pena em regime fechado ou
semiaberto (e também aos chamados presos “provisórios”) e depende, apenas, de
autorização do diretor do estabelecimento prisional onde se encontra o preso. A
concessão da “permissão de saída” é facultativa e só se justifica quando
ocorrer ou o “falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente,
descendente ou irmão” ou, então, a “necessidade de tratamento médico”.
Em qualquer das hipóteses, o
preso sai do estabelecimento carcerário mediante o acompanhamento de escolta
policial e o prazo de sua duração está ligado ao tempo necessário ao
preenchimento da finalidade da saída.
Já a “saída temporária”,
prevista no artigo 122 da LEP, é compreendida como um verdadeiro direito
público subjetivo do condenado, sendo certo que a medida é concedida apenas
pelo Juiz de Direito (após prévias manifestações tanto do Ministério Público
quanto da Administração Penitenciária), aos presos que estejam cumprindo pena
em regime semiaberto e desde que sejam cumpridas certas e determinadas
condições, tais como manter “comportamento adequado”, “cumprimento mínimo de
1/6 da pena, se o condenado for primário, e um quarto, se reincidente” e, por
fim, “compatibilidade do benefício com os objetivos da pena”.
Com relação ao tempo de duração
da “saída temporária”, o artigo 124, da LEP é bem claro ao prever que a
“autorização será concedida por prazo não superior a sete dias, podendo ser
renovada por mais quatro vezes durante o ano”. Ou seja, todo e qualquer
condenado que esteja cumprindo pena em regime semiaberto, desde que preenchidas
as condições legais, pode sair até quatro vezes da unidade carcerária ao longo
de um ano, sendo certo que cada “saída” terá duração máxima de sete dias.
Diferentemente da “permissão de saída”, na “saída temporária” o preso sai do
sistema carcerário sem nenhum acompanhamento ou escolta policial,
sendo certo que o seu
retorno dependerá do senso de
responsabilidade de cada um.
Contudo, é preciso entender que
tal benefício não é concedido apenas como um “prêmio” pelo seu bom
comportamento, mas faz parte, sem dúvida, de algo muito maior e mais
importante, que é, justamente, a ideia de que a pena deve servir à
ressocialização do criminoso.
O condenado voltará ao convívio
social, seja após o cumprimento integral da pena ou mediante a concessão de
livramento condicional. Nesse sentido, as “saídas temporárias” servem como
instrumento importante para se aferir a efetiva recuperação do condenado, ainda
durante o cumprimento da pena. Sem dúvida, trata-se de relevante ferramenta
para estimular o preso a desenvolver boa conduta e assim prepará-lo, de forma
adequada, para que ele retorne, gradativamente, ao saudável convívio social.
Assim, longe de fomentar a
criminalidade ou de sugerir impunidade, o instituto da “saída temporária” deve
ser visto e compreendido como algo benéfico à própria sociedade, na exata
medida em que contribui, e muito, para a ressocialização do criminoso.
Para o leigo, seria até possível
afirmar que o Estado, ao colocar nas ruas um grande número de condenados,
estaria, em realidade, facilitando a “fuga em massa” de detentos e assim
contribuindo para um possível aumento da violência. Ledo engano, porém!
Se tomarmos por base o fato de
que, em geral, o percentual de presos que não retornam às unidades carcerárias
depois de cada “saída temporária” não ultrapassa, em média, a casa dos 8%,
ficará fácil notar que o instituto, de fato, vem alcançando seus objetivos.
Positivamente, seria mesmo uma verdadeira utopia imaginar que, após a concessão
do benefício, 100% dos presos retornassem às suas unidades carcerárias. Nesse
sentido, se é certo que apenas oito de cada cem acabam frustrando a benesse,
então, por óbvio, é preciso reconhecer que a medida é, de fato, eficiente.
Quanto aos tais “oito de cada
cem” que frustram a iniciativa, é preciso dizer que isso representa muito pouco
para a sociedade. Não se pode admitir que um instrumento tão importante para o
condenado, e também para o corpo social, seja tão duramente criticado por conta
de um percentual quase irrelevante.
Os críticos da “saída
temporária” devem ter em mente que, entre perdas e ganhos, é preferível salvar
92% dos presos que cumprem a medida do que, simplesmente, colocar um fim na
benesse por conta daqueles 8% que frustram a finalidade da pena.
É bom dizer que o risco inerente
à medida, à evidência, faz parte do chamado “pacto social” e deve ser entendido
como uma contribuição do corpo social (que é a “maioria”) para a efetiva
recuperação de uma minoria (os presos).
É evidente que o Poder
Legislativo pode, e até deve, propor mudanças na LEP para tentar aprimorar o
benefício da “saída temporária”, o que poderia ser feito com a inclusão de
novos requisitos como, por exemplo, a exigência de comportamento exemplar, o
uso obrigatório de tornozeleiras eletrônicas, o cumprimento de ao menos metade do
total da pena para condenados por crimes hediondos etc. Contudo, o que não pode
ser feito, em nenhuma hipótese, é simplesmente extingui-lo, assim atendendo à
pregação inconsequente de alguns grupos mais radicais, já que tal medida
representaria, no longo prazo, verdadeiro “tiro no pé”.
Euro Bento Maciel Filho é mestre
em Direito Penal pela PUC/SP. Também é professor universitário, de Direito
Penal e Prática Penal, advogado criminalista e sócio do escritório Euro Maciel
Filho e Tyles – Sociedade de Advogados.
Um comentário:
PARA CADA CEM OITO NÃO RETORNAM, QUE FOSSE APENAS UM, JÁ SERIA UM PESO ENORME PARA A SOCIEDADE, UM ABSURDO.
Postar um comentário