Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Cássio
Faeddo
Quem visita Brasília pode ficar
assustado com a quantidade de reuniões e conversas ao pé do ouvido sobre temas
que assustadoramente desconhecemos. Mas essa é Brasília, um grande
equívoco para a administração pública. Uma bela cidade, mas mesmo assim um
erro. É certo que as pessoas fazem a realidade de qualquer cidade, mas o
distanciamento de Brasília do povo brasileiro tornou nossa democracia surda, de
tal sorte que as vozes e desejos do povo estão longe e a burocracia que ali
habita está convenientemente protegida.
Evidente, temos uma opinião que
merece e pode ser contraditada por luzes da realidade de quem habita essa a
cidade administrativa; ninguém está imune a mudanças de convicções. Por ora, é
como enxergamos a capital do país: aparentemente moderna, mas incompetente e
ineficaz para a democracia moderna. Um castelo medieval 4.0, caro e
desnecessário. Ousamos pensar desta forma.
E o que Brasília tem a ver com a
pandemia? Tudo e nada. Tudo porque desde que Jair Bolsonaro assumiu a
presidência do país temos acompanhado um homem com valores e olhos para um
mundo que não existe mais. Uma pessoa que durante todo o mandato tem se
dedicado a confrontar inimigos (digam-se, reais e imaginários) da forma errada.
Sim, há inimigos reais em todos
os lugares; a burocracia e a estrutura da Nova República (aliás, da qual o
presidente faz parte), que se recusam a morrer mesmo golpeadas tantas vezes
desde as primeiras manifestações de 2013, como exemplos.
Mas o que Jair Bolsonaro fez ao
assumir o poder e mesmo antes disso? O primeiro escapismo foi declarar que
havia terceirizado a economia para um economista ortodoxo, uma espécie de
Tutancâmon da economia, esta mesma economia que acaba de morrer com o golpe
final do Covid-19, o Sr. Paulo Guedes.
Assumir a Presidência da
República declarando que desconhece absolutamente economia é como assumir o
volante de um F1 afirmando que não sabe dirigir. Só por isso já deveria ter
desistido do pleito. Mas, sem problemas, outros tantos candidatos também eram
despreparados. Vida que segue.
Porém, no lugar de reformar o
Estado, o Sr. Jair Bolsonaro foi aconselhado a aprofundar uma reforma
trabalhista que blindou maus pagadores e terrificou os pobres, tocada por um
atual Presidente da Câmara dos Deputados que à época do Governo Temer afirmava
não saber o porquê da existência da Justiça do Trabalho. Um senhor que
facilmente adaptou seu discurso para o social após a eleição de Jair Bolsonaro,
mesmo levando em frente também uma reforma da Previdência que atingiu
fortemente o regime geral, mais fragilizado, com o pretexto de acabar com
privilégios.
E o que falar do Sr. Alcolumbre?
Será que este senhor tem experiência e estatura política para presidir uma casa
tão importante para sustentação da democracia brasileira? Como pode esse mesmo
Senado deixar arquivar a MP 905, da Carteira Verde Amarela, como simples
retaliação ao Presidente da República, quando esta deveria ser arquivada com o
fundamento de ser anacrônica, imprestável, e possuir mais de 2.000 emendas? Ou
seja, notoriamente um lixo legislativo inspirado no Século XX, mas habitando o
Século XXI.
E o que dizer de nosso Supremo
Tribunal Federal que decide tantos casos concretos que mais parece um tribunal
de alçada? Por que uma corte constitucional tem tanto poder concentrado por
delegação constitucional?
Ocorre que o Sr. Jair Bolsonaro,
de forma claudicante, por não saber como agir, flerta com golpes a todo momento
e depois retrocede. Vemos hoje um homem atormentado ao ver seu país afundar no
desemprego, tossindo ao discursar em frente ao quartel do exército, pois não
pode falar o que desejaria falar. Deveria deixar de lado esse discurso. Apenas
democracias liberais têm sucesso em médio e longo prazo. A história demonstra.
Sr. Presidente, gostamos da
liberdade da democracia, mas não gostamos de libertinagem como simulacro de
democracia. Isto é certo.
Incrivelmente há tempo para
Bolsonaro mudar. Mesmo passando mais de um ano falando de costumes, de causa
gay, discutindo com Greta, com imprensa, mostrando ignorância sobre trabalho
infantil, dentre tantos discursos imprestáveis para o próprio Jair Bolsonaro.
O Presidente não precisa colocar
tanques nas ruas. Eficaz seria desnudar os hipócritas. Por isso, inicialmente,
o sr. Presidente poderia dar o exemplo e cortar seu próprio salário e exibir
para o país quais outros gastos está cortando, e também deixar claro que os
demais Poderes nada fizeram nesse sentido para enfrentar o aumento de custos.
São despesas absurdas com grande séquito de auxiliares, viagens, carros
oficiais, restaurantes etc. Muitas atividades e despesas para pessoas que pouco
agregam para o PIB do país.
Sr. Presidente, desnude a
hipocrisia e não será necessário colocar tanques nas ruas, nem cabo, nem
soldado, nem Jeep. Nem as Forças Armadas desejam isso. A melhor política no
mundo digital é o constrangimento dos hipócritas e a inteligência. Nada de
“fake news”. Apenas a verdade cascuda e inconveniente.
E por que afirmamos que o
Covid-19 também nada representa nessa história? Porque isso tudo já deveria ter
sido proposto pelo Sr. Temer quando assumiu, ou depois, por Jair Bolsonaro.
Sr. Presidente, temos aqui quase
uma carta aberta, teremos a partir de setembro deste ano grandes e empolgantes
desafios. Precisaremos reconstruir e diminuir a máquina pública, o direito
tributário, reduzindo custos e obrigações, um novo código do trabalho, uma nova
reforma da previdência que envolva benefícios justos e nova fontes de custeio,
ajudar nos projetos de novas matrizes tecnológicas que deverão ser adiantados
em dez anos por causa da pandemia, Internet 5g, rediscutir o papel de nossas
relações com a China e demais países, dentre tantas outras atividades que
exigirão acordar cedo e dormir tarde todos os dias. Talvez duas folgas por mês,
nos moldes da legislação do trabalho chinesa, que nossos legisladores tanto
admiram, mas nada praticam.
Ainda dá tempo, mesmo aqueles
que sabiam das limitações e não votaram em Bolsonaro, mas torcem pelo país,
esperam muito mais da Presidência.
Cássio Faeddo é Advogado. Mestre em Direitos Fundamentais.
MBA em Relações Internacionais - FGV SP.
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