Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por André Luís
Vieira
Não sou cidadão de me manifestar em rede sociais. Na verdade, com exceção
desta para contato profissionais, não tenho perfil cadastrado em nenhuma outra
rede. Minha família e meus amigos sabem bem que exercito conversas
propositivas, sem radicalismos, mas também sem medo de me posicionar. Porém,
igualmente, não acredito em extremismos e radicalismos. Creio, sinceramente,
que os extremos apenas se retroalimentam, gerando uma espécie de soma zero. Uma
operação lógica absolutamente estéril, que só gera dissensão e acirra ânimos.
Resolvi me manifestar aqui justamente por conta no momento trágico em que
vivemos. Recebi de um dileto amigo uma mensagem que diz que o vírus é de
esquerda e o medicamento é de direita. Fiquei estarrecido, perplexo mesmo. A
que ponto chegamos com essa histeria que politiza tudo, que ideologiza a
realidade? Que loucura!
Muito antes do coronavírus, vivemos uma divisão social, um isolamento de
ideias. À direita ou à esquerda, tudo é rotulado e patrulhado, mas enquanto
isso o debate que deveria ser construtivo e propositivo para que nossa
democracia amadureça, modernizando as instituições econômicas e políticas que
permitirão nosso desenvolvimento como projeto efetivo de país, continua
estagnado na soma zero.
Diante dessa pandemia, o fato é que o cidadão está refém de fake
news, desinformação, pós-verdade e ideologismos para todos os gostos. Em
conversas diárias com parentes e amigos, o que tenho observado é um verdadeiro
“Fla x Flu”, onde existem aqueles que querem que dê certo e outros torcendo
pelo contrário.
No fundo e ao cabo, é a sociedade que está perdendo a
oportunidade de debater mudanças verdadeiramente necessárias e inclusivas, isso
porque a informação não circula de forma agregadora, mas como uma ladainha
cansativa e enfadonha de antagonismos sucessivos e improdutivos. Perde também a
sociedade porque a opinião pública foi substituída pela opinião midiática e
esta se mostra a serviço de seus próprios interesses, como ocorre em qualquer
institucionalização. A sociedade perde igualmente para a hipocrisia e para
incoerência, para o debate raso e ofensivo. Perde tanto para o populismo,
quanto para o oportunismo.
Espero, sinceramente, que com o passar dessa pandemia surja uma nova
cidadania, mais consciente de seus direitos, mas também de seus deveres. Uma
cidadania capaz de refletir democrática e dialogicamente sobre os rumos do
nosso país. Que surja uma cidadania realmente capaz de refletir sobre atuação
de nossas instituições políticas e econômicas. E mais, que esta seja capaz de
exercer seus legítimos interesses na condução e na prestação de contas da coisa
pública, ampliando-se os mecanismo de participação.
Aos meus amigos de direita, mantenho o debate para não ser simplesmente
rotulado como de esquerda, apenas por buscar compreender uma visão das mazelas
sociais e de afirmar que o mercado não tem soluções eficientes para todos os
problemas. Aos meus amigos que se intitulam de esquerda, tento mostrar que a
racionalidade econômica é fundamental para que o Estado seja mais eficiente, ao
mesmo tempo em que este também não detém todas as soluções. Ao me posicionar
desse jeito, alguns afetos ao patrulhamento ideológico me rotulam de “isentão”.
Sinceramente, não me importo. O que interessa é tentar criar um ambiente de
permanente diálogo, onde o que precisamos é sermos capazes de refletir sobre as
verdadeiras causas da mediocridade presente na mentalidade nacional. Precisamos
verdadeiramente de debates que nos levem a superar as antiquadas instituições
econômicas e políticas, essas sim, concretos obstáculos que não nos permitem
figurar entre as nações mais desenvolvidas.
Como sociedade democrática, para onde estamos caminhando com toda essa
politização, com toda essa ideologização? Não faço ideia...
Agora, quando tudo isso passar e, sabemos que irá passar, espero que
sejamos capazes de enfrentar o vírus mais persistente de nossa sociedade: a
corrupção sistêmica. É este o poderoso vírus que mantém crônica a falta de
infraestrutura, permanente a insegurança pública e caótica a saúde pública.
Esses são os reflexos do vírus pandêmico com os quais nossa sociedade,
infelizmente, se acostumou a conviver...
O desafio ético da pandemia é, em última análise, também o desafio ético
próprio da democracia!
Espero, com profunda sinceridade, que nossa cidadania saia fortalecida
disso tudo!!!
André Luís
Vieira é Advogado.
6 comentários:
Belo texto Sr. Andre Luís Vieira:
A pergunta que resta a responder é qual cidadania/democracia nos restará a defender se a esquerda, nítidamente simpática ao socialismo/comunismo prevalecer.
Para além de apenas opiniões divergentes, não creio que seja difícil constatar que estamos numa bifurcação entre esquerda e direita (comunismo ou democracia). Vale lembrar que uma bifurcação não tem terceira via.
Façam suas escolha Senhores.
Amém!
Sr. Silvio Friederichs, obrigado pelo seu comentário.
A racionalidade que busco em meu comentário é eliminar o extremismo e o radicalismo, justamente para que a "terceira via" seja a do equilíbrio na alternância de poder saudável para a democracia. Há sim pontos de aproximações possíveis entre a esquerda e a direita!
Da mesma forma, não visualizo necessária e obrigatoriamente que a direito seja democrática. Há história é riquíssima em exemplos de substituição de uma tirania por outra, notadamente nos casos em que esta última tenha se legitimado no combate à primeira.
Minha escolha está feita!!! Envidar esforços para que o diálogo esteja sempre presente, na construção de soluções.
Essa é a minha modesta contribuição...
André.
Sr Silvio Friederichs, obrigado pelo seu comentário.
Obrigado pela elegância da resposta. Dá gosto debater com intelectos deste nível.
Na minha modesta opinião, qualificar a contenda que vemos como de esquerda ou direita é uma espessa cortina de fumaça para embassar as percepções. Não existe demérito em ser de esquerda (ou de direita) pois esta é o outro prato da balança para atingir o tão desejado equilíbrio. Esta é a essência da democracia. Sem os dois lados NÃO EXISTE democracia.
Entretanto, olhando além dessa cortina de fumaça, enxergamos que quem está no ringue de luta são a democracia versus o comunismo, não apenas no nosso Brasil mas também a nível global. Enquanto não se analisar com este prisma, continuaremos nesta torre de babel intelectual.
Cordiais saudações.
Prezado Sr Silvio Friederichs, boa tarde.
Sou eu quem lhe agradece pelo comentário generoso e pelo debate em alto nível.
Concordo integralmente com o seu comentário! Igualmente concordo que se trata de um debate ocidental, com reflexos globais.
Há alguns anos, li uma reportagem da revista The Economist intitulada "Nordic countries" ou alguma coisa assim. Por intermédio da experiência nórdica exposta na reportagem, é que observei que as mazelas do nosso país, passam ao largo desse debate infrutífero.
Os países nórdicos, embora estados de tendências socializantes e coletivistas até as décadas de 60 e 70, apartir dos anos 80 promoveram profundas reformas em suas instituições políticas e econômicas que os permitiram manter a lógica socializante dos serviços públicos prestados pelo estado, mas com grande dinamismo econômico. É tanto que essa racionalidade foi suficiente para atrair grandes investimentos privados de empresas de classe mundial, particularmente nos setores econômicos intensivos em tecnologia.
Na verdade, trata-se de escolhas públicas que vão além do debate estéril entre esquerda e direita. Particularmente, me identifico com o centro-direita, mas não tenho qualquer dificuldade em debater com pessoas de centro-esquerda. Confesso minha dificuldade em debates mais radicalizados, seja pela hipocrisia, seja pela incoerência.
Mais uma vez, reafirmo o meu prazer nesse debate franco e construtivo.
Cordialmente, André.
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