Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por André
Luís Vieira
A crise gerada pela pandemia do COVID-19 é incontornável. Por mais que
tentemos relaxar um pouco e falar sobre outras perspectivas nesse momento de
isolamento social, parece que uma calmaria inquietante toma conta de nossa
realidade e a conversa flui sempre para o mesmo assunto, o coronavírus e seus
reflexos sociopolíticos. Então, se é inevitável, vamos ao tema!
Não vemos à hora de nossas vidas voltarem ao normal, podermos sair de
nosso confinamento, abraçar nossos entes e amigos queridos, trabalhar, nos
locomovermos sem maiores restrições; enfim, desfrutar de todas as vicissitudes
de normalidade, assim aceitas pela dinâmica da vida contemporânea.
Ocorre que voltar à normalidade também significa retorno ao permanente
sentimento de insegurança pública, ao caos na saúde e na educação, aos
escândalos de corrupção sistêmica. Na verdade, a nossa realidade é mais
persistente do que o vírus. Nossa maior tragédia? A ideologização de nossas
mazelas sociais.
Enquanto isso, o acirramento dos ânimos só aumenta. Estamos num ambiente
de quase inescapável politização polarizada no debate público. O mais
interessante é que a palavra democracia é sempre utilizada como agente
legitimador de ações em todos os matizes. Trata-se de narrativa retórica e
amplamente demagógica!
Esse debate sobre a aristocratização da democracia é secular. Desde a
Grécia antiga se assiste a utilização da retórica democrática, pelas
oligarquias de plantão, para legitimar a geração de demandas artificiais que,
no fundo, só fazem desrespeitar a vontade da maioria.
Enquanto conceito juspolítico e histórico, arrisco expor a visão de que
por democracia se entende o respeito à vontade da maioria, preservando-se os
direitos das minorias, visando ao pluralismo político e ao aperfeiçoamento das
instituições na busca, utópica que seja, pelo bem comum.
Ocorre que no Brasil, democracia se apresenta como sinônimo de voto, o
que deveria ser absolutamente combatido. Democracia não é só voto, é
participação, até porque, em nosso sistema eleitoral de coeficientes, legendas
e coligações, elegem-se figuras completamente sem representatividade ou
compromissos públicos que possam ser cobrados por seus representados
(eleitores). Portanto, o dever ético impõe que o voto não seja um mero cheque
em branco. Se não for assim, as velhas oligarquias e instituições do atraso
tendem a se perpetuar, nos mantendo na soma zero!
Mais do que nunca, precisamos de instituições políticas e econômicas que
nos permitam repensar o Brasil para o futuro e não para continuarmos a ser o
“país do futuro” que não consegue se enxergar para além do próximo período
eleitoral. Precisamos de um sistema democrático que nos permita pensar e
planejar o Brasil estrategicamente, rumo ao almejado desenvolvimento
socioeconômico.
O fato é que necessitamos, urgentemente, de instituições que nos
consintam pensar seriamente nos rumos pós pandemia, ao mesmo tempo em que a
enfrentamos. Precisamos sim de ações de governo, mas igualmente de visões de
Estado!
Se insistirmos nos debates públicos que só enxergam o Brasil até 2022, ou
seja, se a retórica demagógica e polarizada somente nos autorizar a visualizar
horizontes meramente eleitoreiros, vaticino que nossa tão propalada democracia
não terá o menor perigo de dar certo! Continuaremos na democracia de soma
zero!!!
A crise brasileira é permanente, apenas o mote para o acirramento
político e ideológico do momento é o perigo que a pandemia representa. Senão
fosse o COVID-19, certamente estaríamos experimentando outras crises,
provavelmente não com a mesma grandeza. Nossa crise é institucional e ética!
Portanto, qualificar a contenda atual a uma mera disputa entre direita versus esquerda
é criar uma espessa cortina de fumaça, um reducionismo oportuno para embasar a
falta de percepção cidadã sobre o status quo ante, sobre a corrupção
sistêmica, sobre os baixíssimos índices educacionais, sobre tantas e absurdas
mazelas sociais que nos assolam.
Há alguns anos, li uma reportagem da revista The Economist sobre
os “Nordic countries”. Por intermédio da experiência nórdica exposta na
reportagem, é que observei que as mais profundas mazelas do nosso país, passam
ao largo desse debate infrutífero. Os países nórdicos, embora estados de
tendências socializantes e coletivistas até as décadas de 60 e 70, a partir dos
anos 80 promoveram profundas reformas em suas instituições políticas e
econômicas que os permitiram, por exemplo, manter a lógica dos serviços
públicos prestados pelo Estado com o mesmo dinamismo econômico daqueles
oferecidos pelo setor privado.
É tanto que essa racionalidade foi suficiente
para atrair grandes investimentos privados de empresas de classe mundial,
particularmente nos setores econômicos intensivos em tecnologia, e promover um
modelo de desenvolvimento socioeconômico que representa um dos maiores IDH no
mundo. Na verdade, o futuro de um país repousa sobre suas escolhas públicas, o
que segue muito além do embate entre direita e esquerda.
Sinceramente, apesar de minhas convicções pessoais, não vejo demérito em
quem se declara com convicções políticas e ideológicas diversas, desde que isso
não sirva de pressuposto ao radicalismo infértil e ofensivo, até porque a
“balança do poder” exige contrapontos e pluralismos para se atingir o tão
desejado equilíbrio institucional. Esta é a essência da democracia. Sem o
pluralismo não existe o exercício democrático em sociedade!
Mais uma vez, reafirmo o compromisso nesse debate franco e construtivo,
em me posicionar, sem radicalizar. Particularmente, não me identifico com
debates radicalizados, seja pela hipocrisia, seja pela incoerência, seja pela
demagogia.
O único interesse é envidar esforços no meu ambiente, familiar e social,
para que o diálogo esteja sempre presente, na busca por soluções e em respeito
ao tão combalido interesse público. Minha escolha está feita!!!
André Luís Vieira é Advogado.
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