Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Higino
Veiga Macedo
Em tempo de coronavírus, há tempo para recordar os recentes “moídos” como
falam os paraibanos, quando é coisa enrolada. O que pretendo abordar deixa de
ser recordar para ser ruminar o que passou.
Trata-se dos movimentos de greve de policiais militares, no carnaval 2020
tanto no Ceará como na Paraíba, e neste, de modo mais rápido e “menos
consequência”.
Do Jornal O Estado de Minas – https://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2020/03/01/interna_nacional,1125416/policiais-encerram-greve-no-ceara.shtml
copio três trechos do acontecido no Ceará:
- “Os policiais militares que estavam amotinados no 18º Batalhão da PM,
em Fortaleza, votaram pelo fim da greve na noite deste domingo”.
- “A proposta apresentada pela comissão apresenta os seguintes termos: os
policiais terão apoio de instituições que não pertencem ao governo do Estado,
como Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Defensoria Pública e Exército; terão
direito a um processo legal sem perseguição, com amplo direito a defesa e
contraditório”...
- "Hoje temos apoio do Exército, da OAB, da Defensoria
Pública... orientou o deputado Soldado Noélio, que foi nomeado interlocutor dos
policiais para dialogar com o governo sobre os interesses da categoria”.
A Secretaria de Segurança - CE informou que houve no período em torno de
312 mortes. Detendo-me apenas em PM, porque há greves de policiais militares já
há algum tempo no Brasil há, a meu ver, inúmeros culpados, a começar pelos
legisladores. Começo pelas Constituições Federais. Sem ser jurista, mas
com educação formal que permite ler e interpretar, arrisco a comparar a CF-67
com a CF-88, no que é pertinente.
Ao reportar à Constituição da República Federativa do Brasil de
1967, lê-se:
CAPÍTULO III - Da Competência dos Estados e Municípios
Art. 13 - Os Estados se organizam e se regem pelas Constituições e
pelas leis que adotarem, respeitados, dentre outros princípios estabelecidos
nesta Constituição, os seguintes:
§ 4º - As polícias militares, instituídas para a manutenção da ordem
e segurança interna nos Estados, nos Territórios e no Distrito Federal, e os
corpos de bombeiros militares são considerados forças auxiliares, reserva do
Exército.
Destaca-se, do § 4º, que as polícias militares são consideradas forças
auxiliares, reserva do Exército. É claro é o “impérium” do Estado Federal. Há
aí um vínculo constitucional PM e EB.
Na dita Constituição Cidadã – Constituição da República Federativa
do Brasil, texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, vê-se...
CAPÍTULO II – Das Forças Armadas
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e
pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares,
organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do
Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos
poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da
ordem.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: (EC no
19/98 e EC no 82/2014) I – polícia federal; II – polícia rodoviária federal;
III – polícia ferroviária federal; IV – polícias civis; V – polícias militares
e corpos de bombeiros militares.
§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças
auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias
civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
Bom, esse parágrafo foi remendado, pois uma constituição não pode,
filosoficamente, sofrer emenda. A Redação é a original, o que me interessa.
A cidadã define apenas as FFAA, no Art. 142. A Segurança Pública, com
algumas emendas, só aparece no Art. 145. Nesse Art. 145 é “dever do
Estado” não definindo se PM é do Estado Federal ou do Estado
Federado, como é claro na CF-1967. Caminhando até ao § 6º, aparece a
subordinação da PM: “As polícias militares”..., “subordinam-se”,... “aos
Governadores dos Estados”, embora antes registre que é força auxiliar e
reserva do EB.
A partir da CF-88, as PM tornaram-se as FFAA dos governadores. Houve a
quebra do vínculo entre as PM e o Exército.
Cada Estado Federado passou a organizar sua PM segundo a doutrina
ideológica dos governadores. Quase sempre hostis às FFAA, sem poder se vingar
delas, preferiram vingar-se nas PM, força auxiliar daquela, por estar mais perto
destas.
Perdeu-se a unidade de doutrina; desequilibraram-se as promoções,
perdeu-se a qualidade do adestramento, desfigurou-se como militar ao optar por
regime de trabalhos de funcionários civis; matou o espírito de corpo;
abandonaram os aquartelamentos; a ação preventiva tornou-se a segunda ou
terceira prioridade, isto é, no linguajar popular: “virou bico”.
Ao se desvincular do Exercito, o preparo, que era de infantaria em
operações em área urbana, foi abandonado. Cada Estado, rapidamente montou sua
Academia de Polícia e cada uma passou a ensinar o que bem entendia. Não houve
mais doutrina de emprego. A doutrina, o preparo e o emprego de força de
segurança foram orientados por sociólogo, antropólogo, psicólogo... .
O plano de carreira deixou de ser orientado pelo Exército. Assim, cada
estado criou sua lei de promoção. Os oficiais passaram, cada vez mais cedo, a
bajular deputados e secretários de estado, como assistentes, para fugir das
patrulhas. Por indevida interferência do bajulado, o submisso assessor era
promovido por mérito. O mérito não era a avaliação na atividade fim, mas da
autoridade bajulada. Houve estado com o dobro de “coronel pleno” para o número
de vagas. Houve promoção a tenente-coronel quando a turma ainda era capitão.
Por “aventurismo” de oficiais superiores, as PM abandonaram seus quartéis
e com isso os espaços para adestramento, no mínimo de tiro. Em fim, perdeu-se o
adestramento e a eficiência do emprego. Hoje, o emprego é sofrível. O
aproveitamento do terreno, o apoio mútuo, o armamento adequado para cada
missão, o comando de grupos e ou pelotões em para área urbana, a abordagem de
objetivo, a busca de alvo, tudo é deprimente. Os bombeiros têm seus quartéis.
Os bombeiros se adestram ali.
Desfigurou-se a essência milenar da ação militar: a vocação. Floresceu o
mercenarismo. Mataram a organização ternária: enquanto um vigia, dois
descansam. Optaram pela comodidade. Lamentável, para sua história,
fizeram a opção civil de trabalho de vinte e quatro horas por setenta e duas de
descanso. Disse uma vez um oficial angolano: “a militarização do civil é
um ganho; a “civilitarização” do militar é um desastre”. Argumento
assustadoramente “inconvincente”: economia de rancho, de alojamento; de
manutenção... Após o seu serviço o PM leva o armamento e munição,
públicos, para suas próximas atividades de setenta e duas horas: segurança de
alguma coisa. Os poucos quartéis são apenas garagens. Nada mais resta de
militar. A PM foi “civilitarizada”. Perderam o espírito de corpo. Mantém alguma
hierarquia e baixa disciplina.
Os governos estaduais ou eram marxistas ou eram admiradores: por covardia
e ou por conveniência. A Constituição-88 foi elaborada por partidários
ideológicos, na maioria marxista e não por juristas. É ideológica, não técnica.
Assim, deixou abertamente oportunidade para se aparelhar o Estado Federal com
partidários, cada um com missão. Uma enorme oportunidade foi o permitir a
sindicalização de elementos do Estado. Aí as PM passaram a sindicalizar-se. Por
terem o timbre militar, são proibidos de sindicalização como as FFAA. O Art. 42
da CF-88, e seus parágrafos, com remendo sobre remendo, assim os timbram.
Mimetizaram os sindicatos em Associações, Na verdade, cartéis partidários com
suporte de partidos marxistas com PM filiados. Tem associação de cabos; de
soldados; de sargentos; tem de praças (os três reunidos) tem de oficiais; de
oficiais superiores... uma festa.
Volto ao transcrito do Jornal de Minas.
- “policiais militares que estavam amotinados”... votaram pelo
fim da greve...
Ora, se a CF-88 proíbe GREVE, os amotinados deveriam ser atacado
por força maior, depois de receberem ordem para baixar a armas e serem todos
preso e condenados por insubordinação, indisciplina, tudo crime militar;
–. “os policiais terão apoio de instituições que não pertencem ao governo
do Estado”... Ninguém, a não ser o comando geral da PM e o Governador, que pela
CF-88 é o Comandante Geral, deveria estar lá... Muito menos entidades civis.
Nem o Exército deveria estar lá, como visita. Não souberam impor-se pelo
comando. Cederam por negociação com facções partidárias.
– "Hoje temos apoio do Exército, da”... “orientou o deputado
Soldado Noélio, que foi nomeado interlocutor dos policiais para dialogar”...
Interlocutor com amotinado? O Deputado Soldado Noélio?... Moralmente
nem poderia usar o nome da graduação... Seguiu o mesmo caminho de qualquer
sindicalista... Falta apenas ser filiado a uma CUT Militar... E o Exército se
fez representar numa barbaridade dessas... Enterraram a disciplina, a hierarquia
e a lealdade, na lama. Quem comanda na verdade são as associações. Mesmo assim,
pela Constituição são militares e são organizados com base na Hierarquia e
Disciplina. Mas quem comanda? O governador ou o Presidente da Associação? ou o
Cabo Deputado? Onde foi para a Hierarquia e a Disciplina. Onde está o militar?
A CF-88 permitiu que as PM fossem desorganizadas e, com apoio de seus
oficiais, teceram a corda de suas forcas. São levados a cometerem crimes
militares por não terem comando.
Quo Vadis PM do Brasil?
Higino
Veiga Macedo Coronel Reformado de Engenharia do EB.
Um comentário:
Muito bem analisado! Parabéns, Higino!
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