Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Antonio Celeari
Para além do comedimento de uma insípida digressão
teórica, costumeiramente entrincheirada no padrão de discurso “técnico e
jus-acadêmico”, há de se denunciar, sem subterfúgios e à vista dos mais altos
valores envolvidos, o caráter nada menos do que bestialógico atinente à
iniciativa do “socialista e libertário” deputado federal Cabo Daciolo
(ex-PSOL/RJ), traduzida na Proposta de Emenda à Constituição nº 12 de 2015.
Pretende tal parlamentar que o parágrafo único do Art. 1º
da Carta Magna passe a vigorar com a seguinte redação: “Todo o poder emana de
Deus, que o exerce de forma direta e também por meio do povo e de seus
representantes eleitos, nos termos desta Constituição“.
Empreendida uma leitura bastante atenciosa, tanto da
minuta normativa quanto de sua pretensa justificativa, chega a ser
inacreditável constatar tamanha desinibição; esta última a indicar uma
tendência de gradual receptividade ao rompimento com o Princípio da Laicidade
do Estado.
Trata-se, unanimemente entre os cidadãos com o mínimo de
massa encefálica, de uma rara e declarada coleção de impropérios
obscurantistas. E pasmem: inconsequentes cento e setenta e dois congressistas
subscreveram o documento!
Para além do ponto de partida, no qual o demérito do
projeto é pressuposto, há de se simular um cenário futuro, muitíssimo factível,
em que o fundamentalismo ganhe cada vez mais espaço na política nacional. Não
há quem negue – salvo improvável juízo – o já elevado e ainda crescente nível
de influência que as seitas religiosas detêm, insinuando-se em todas as esferas
sociais: meios de comunicação, governos, editoras, instituições de ensino,
grandes empresas, bancadas legislativas suprapartidárias e, inclusive, por meio
de milícias paramilitares em formação.
A sacrossanta “liberdade religiosa”, tida praticamente
absoluta, tem se constituído em verdadeiro salvo-conduto para a exploração dos
desesperados e dos suscetíveis à manipulação psicológica. Seu vetor coletivo se
mostra a cada dia mais imiscuído com o fisiologismo político,
revelando um explícito projeto de poder, a pretexto do exercício de liberdades
individuais irrestritas.
Até mesmo os partidos reputados historicamente ligados a
esta ou aquela virtude ideológica têm sido, diuturnamente, apropriados pelo
poderio econômico e tomados de assalto pelo crime organizado. Quem ousaria
chamar à responsabilidade os líderes de quadrilhas sacerdotais, para os quais a
salvação espiritual, no Reino de Deus, é antecedida pela dominação material, no
Reino dos Homens?
No suposto “governo do povo”, à crua quantificação de
vontades não corresponde qualquer compromisso qualitativo: a manada entoa seu
coro e quem não gostou que vá, ingenuamente, elucubrar sobre o direito das
minorias. Se todo o poder emana de uma maioria lobotomizada, e esta resolve
delegar sua representação aos incólumes pontífices divinos, restará aos
humanistas chuparem o dedo. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Ou alguém
realmente acredita que no âmbito dos ditos “movimentos sociais” e demais
concílios populares não há alguém puxando a cordinha por detrás?
Só se vence eleição e se governa após anuir com as regras
de um jogo sujo, de cartas marcadas, não nos cabendo encampar as teses
embasadas na ilusão do institucionalismo, que é relegado à virtualidade quando
de transições como as que se anunciam.
Soa irônico o fato de que a defesa dogmática do sufrágio
universal, causa primária da atual ameaça, seja feita justamente pela
“elite da elite” brasileira: parte dos intelectuais e das pessoas de destaque
em nossa sociedade.
Nunca cogitaram eles próprios a fatalidade de serem
fagocitados pela horda de inimputáveis?
Não vislumbram os esclarecidos e os catedráticos que, em
hipótese-limite, fosse referida Emenda à Constituição declarada desconforme ao
texto originário, o problema prático e conceitual restaria, ainda assim, muito
longe de ser sanado. Nada impede que se tenha o acinte de convocar nova
assembleia constituinte onipotente, incondicionada e cuja autonomia e
desvinculação com a ordem anterior são características reconhecidas
intrínsecas.
A Democratite Palaciana, disseminada entre os seres
pensantes que se rebaixam ao nível da plebe, assenta, invariavelmente, as bases
de um vindouro Sufrágio Teocrático.
Por ocasião desta possível refundação de nossa república,
os democratas convictos terão de – finalmente – se assumir ventríloquos da
mítica “Vox Populi”, relegados ao passado e submetidos, agora, ao
império da “Vox Dei”. Superado o erro original, hão de declarar
ilegítima a ditadura da ignorância.
A concepção aristocrática virtuosa deverá emergir impoluta
e alheia ao discurso majoritário, tempestivamente, sob pena de ingressarmos em
uma nova Idade das Trevas, em pleno Terceiro Milênio, ao molde das teocracias
já existentes e que se encontram em nítido movimento de expansão. E o pior de
tudo: a justa resistência acabará por desencadear uma guerra civil de
prognóstico incerto.
Um comentário:
Gente, é burrice isso. Cristo, nosso exemplo maior, NUNCA pregou separação e ódio. A LIBERDADE RELIGIOSA, o respeito a qualquer religião É ESSENCIAL à vida e ao bom entendimento humanos. Porísso mesmo me solidarizo com o autor do texto sobre a inconveniência de se misturar religião (no sentido de igrejas) com o estado. O estado tem que ser laico, sim. PORISSO mesmo, não devemos ter A IGREJA CATÓLICA, sempre metida na política, seja pela CNBB ou qualquer outro organismo qualquer. Da mesma forma, não devemos ter qualquer outra religião (seja que denominação for) como religião de estado.
Ao ler o texto, notei essa "pérola": "Não há quem negue – salvo improvável juízo – o já elevado e ainda crescente nível de influência que as seitas religiosas detêm, insinuando-se em todas as esferas sociais..." Oras, já cansou, ou melhor já encheu o saco essa coisa de "donos da consciência religiosa do povo", exibida como uma sentença por aqueles que são católicos e também por agnósticos, ao tachar de "seita"(de forma pejorativa), as religiões dos outros. Ou seja, se não é católico, então é seita, algo abominável e não "santificado".
Postar um comentário