Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Arthur Jorge Costa Pinto
Ao final do primeiro semestre deste ano, parece-me que os
mercados mundiais passaram a respirar um pouco mais aliviados, principalmente
após as eleições realizadas na França pois, de certa forma, diminuiu o temor de
um rompimento na região do euro com a ascensão de “eurocéticos” após o Brexit
em meados de 2016.
Entretanto, os riscos políticos seguem aflorados ao redor do
mundo, sinalizando possibilidades concretas de impactos na economia global. Uma
das crises, dentre outras existentes, que vem encorpando há algum tempo, tem
sua origem no Japão, a terceira economia do mundo, podendo ocasionar uma
mudança relevante na sua política econômica.
O Japão se encontra numa condição bastante vulnerável diante do
ambiente econômico internacional em função de ser largamente dependente de
exportações. Sua fragilidade nos últimos anos é um ponto a se destacar, uma vez
que a economia japonesa conheceu períodos de recessão em função da
desaceleração da economia mundial e das catástrofes naturais que atingiram em
cheio o arquipélago. Em 2016, seu crescimento econômico continuou fraco (0,5%),
estimulado pelo comércio externo e o consumo interno.
Provavelmente esse cenário poderá melhorar um pouco ao longo
desse exercício. O Japão tinha uma participação no PIB (Produto Interno Bruto)
global de 7,8%, em 1980,tendo subido para 9% em 1991. Mas com a longa
estagnação da economia japonesa, a participação do país caiu para 4,3% em 2017
e deve ficar em 3,7% em 2022. O Japão deve perder uma fatia de 4,1% do PIB
mundial em 42 anos.
Além disso, o risco de deflação ainda permanece, já que o país
nos últimos dois anos registrou taxas positivas, contudo muito próximas de
zero. A dívida pública continua elevadíssima (acima de 240% do PIB), sendo ela
recordista nesse quesito entre todos os países. A justificativa para este
descalabro macroeconômico se deve à sua política fiscal expansionista dos
últimos anos, especialmente depois da crise financeira global de 2008/2009,
além dos altos custos de reconstrução após o terremoto e o tsunami de março de
2011.
A grande questão é que o país está imerso em um longo período de
estagnação econômica, que alterna períodos de baixíssimo crescimento com
deflação, sem encontrar, na realidade, uma saída. São duas décadas de frustração
e diversas tentativas para revitalizar sua economia.
A gestão do atual primeiro ministro, iniciada ao final de 2012,
está marcada por elevadas suspeitas de nepotismo como também a concessões de
grandes favores, provocando enormes reações populares, sendo que as pesquisas
divulgadas recentemente denotam que sua aprovação é inferior a 30%. O baque na
sua popularidade foi extenso, deixando o povo japonês decepcionado e
intransigente quanto á sua efetiva liderança e, também, com relação às questões
que envolveram a ex-ministra da Defesa.
Ao final de julho passado, ela renunciou ao cargo em meio a
documentos que atestam sua colaboração para dissimular os registros que
mostravam o imenso perigo enfrentado pelas forças de paz japonesa no Sudão do
Sul. Rapidamente, foi feita a substituição ministerial, na tentativa de
acobertar sua vergonhosa popularidade, colocando-se na pasta uma nova ministra
que já teve a oportunidade de ocupar anteriormente esta função.
Existe uma dúvida crescente se o premier ainda estará ocupando o
cargo até as próximas eleições legislativas. Caso venha a deixá-lo antes do
pleito, uma das questões que preocupam intensamente os investidores é seu plano
keynesiano, comumente conhecido como Abenomics (a política econômica de Abe)
que, sem a sua liderança, continuará conservando integralmente sua estratégia
política de gerar crescimento nos lucros das empresas, dos salários e do
consumo e pôr termo ao ciclo deflacionário que afeta significativamente a
economia japonesa.
Os três pilares do Abenomics, também apelidado de “Plano das
três flechas” são: a política fiscal, a flexibilização monetária e as reformas
estruturais. Com relação aos dois primeiros pontos, eles vêm sendo conduzidos,
mas quanto às reformas, elas ainda estão sendo encaminhadas. Acontece que da
maneira como a imagem do primeiro ministro vem se enfraquecendo, as inevitáveis
reformas passam para o segundo plano, pois seu objetivo maior é centrar
esforços a fim de recompor sua reputação eminentemente abalada. Qualquer
semelhança com outras nações, notadamente o Brasil é, simplesmente, mera
coincidência.
Evidentemente o escândalo tornou-se uma forte ameaça para o Abenomics
porque o seu índice de aprovação já vinha declinando mesmo antes de pequenas
reestruturações ocorridas. Pelo visto, somente conseguindo ele uma alta taxa de
aprovação dos japoneses poderá iniciar a retomada das imprescindíveis reformas
estruturais.
Alguns analistas admitem que a probabilidade da queda do chefe
de governo é relativamente pequena, mas, de certa forma, existe uma aparente
possibilidade de ele não estar no cargo em setembro de 2019, quando se encerra
seu mandato. Para outros, se ele for realmente embora, o Abenomics certamente
deverá acompanhá-lo. É igualmente provável que isso venha a comprometer as
políticas monetárias não convencionais do Banco do Japão (BOJ – Banco Central)
a exemplo do poderoso “QuantitativeEasing” (QE), adotado em larga escala
(criação de dinheiro novo para injetar na economia e estimular a atividade
econômica).
Nesse aspecto, é plausível que o próximo presidente do BOJ, cujo
mandato também termina em 2019, seja substituído por um profissional que talvez
não seja favorável a continuar insistindo nas políticas de “taxa-zero” que
visam controlar a deflação e venha a ampliar o consumo realizado pelas
famílias, considerando que, até o momento, os esforços para tirar o país da
estagnação não apresentaram os resultados esperados. Por outro lado, existe a
hipótese de que o atual ministro do Exterior venha a substituí-lo, quando então
poderá adotar mudanças no Abenomics, mas sem provocar uma ruptura na concepção
do plano.
São pontos negativos o envelhecimento da população, os políticos
que persistem nos mesmos erros, aumentando os gastos, os impostos, deixando o
lugar cada vez mais difícil para se empreender e as leis trabalhistas difíceis
de seguir. As tensões políticas, sobretudo com a China e a Coréia do Sul e
outros emergentes são também fontes de preocupação que o Japão terá que levar
em consideração nos próximos anos.
A humanidade tem experimentado sérios conflitos e vultosas
crises não só políticas, econômicas, sociais e muitas outras de igual
importância, as quais se diferenciam apenas pelo motivo, gravidade,
localização, intensidade e época. Considero a pior delas a “Crise de Ideias”,
pois ela, para mim, é a “mãe” de todas.
Arthur Jorge Costa Pinto é
Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).
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