Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Ricardo
Perfeito
O que é, afinal, voto distrital? A melhor forma de responder é explicando
como funciona o sistema atual.
1º - O que é o Sistema Proporcional
O sistema proporcional é, hoje em dia, o sistema pelo qual elegemos
Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores. Por ser o de mais fácil
compreensão, vamos usar, como exemplo, a eleição de Deputados Federais.
Hoje, o eleitor vota em qualquer candidato de qualquer partido que
concorra em seu Estado. O morador lá de Ourinhos – SP, pode votar em Paulo José,
candidato do Partido “Z”, cuja carreira política esteve sempre vinculada a
outra cidade, situada no extremo oposto do Estado. As razões para alguém votar
em um sujeito, assim, tão distante de sua própria comunidade, podem ser várias:
ele pode ser bonitão, ou um grande artista, ou ter um bom discurso, ou ser um
craque no futebol, e por aí vai.
No sistema proporcional, além disso, votar em um candidato significa
votar, indiretamente, no partido do candidato (o tal "voto na
legenda"). E isso acaba beneficiando outros candidatos desse partido,
ainda que o eleitor não conheça nenhum deles e apenas queira votar no Paulo
José, um cara simpático. Vamos explicar mais adiante como isso funciona, mas já
tenha isso em mente agora.
2º - A
herança de Getúlio
No Brasil, esse sistema proporcional começou a ser montado a partir 1932,
momento da ascensão de Getúlio Vargas ao poder. E foi montado com um objetivo
claro. Nas palavras de Fábio Comparato, a intenção era criar um sistema
eleitoral "duplamente fraco", tanto "pela ampla liberdade de
criação de partidos" como "pela introdução de voto em candidatos
individuais, e não em partidos" (em A Necessária Reformulação do Sistema
Eleitoral Brasileiro, ed. Del Rey, 1996). Todo mundo sabe o que aconteceu
depois: Estado Novo, totalitarismo, repressão.
Trata-se de um sistema que, aparentemente, possibilita que pequenos
partidos tenham acesso ao poder. Porém, a consequência prática é pulverizar a
representação dos interesses da população em inúmeros partidos. Dividir para
conquistar, uma técnica utilizada por Getúlio Vargas com muito sucesso.
E o resultado é o que vemos hoje no Brasil: um excessivo número de
partidos, exigindo que os governantes costurem sua base parlamentar com a
agulha dos favorecimentos pessoais, distribuindo cargos entre várias legendas
para, através de acordos e apadrinhamentos, alinhavar o apoio do Poder
Legislativo.
Além disso, o sistema proporcional faz com que os holofotes da campanha
eleitoral estejam voltados para a pessoa de cada candidato, e não para o
programa do partido, já que o eleitor pode escolher entre dezenas de candidatos
de diversos partidos atuantes em todo seu estado, e isso abre demais o leque de
opções.
Como diferenciar vários candidatos de um mesmo partido, senão ressaltando
suas diferenças individuais, em detrimento do programa partidário? Essa é uma
das causas daquele problema diagnosticado com precisão pelo ex-Ministro Joaquim
Barbosa, gostemos ou não das outras posturas do Ministro:
“Nós temos partidos de mentirinha. Nós não nos identificamos com os
partidos que nos representam no Congresso, a não ser em casos excepcionais. Eu
diria que o grosso dos brasileiros não vê consistência ideológica e
programática em nenhum dos partidos. E nem pouco seus partidos e os seus
líderes partidários têm interesse em ter consistência programática ou ideológica.
Querem o poder pelo poder.”
3º - Ganha
um montão de votos e não se elege?
Em 2002, por exemplo, Enéas Carneiro conquistou 1,5 milhão de votos na
eleição para deputado federal em São Paulo e levou para a Câmara outros quatro
deputados do Prona. O último eleito do Prona naquela ocasião recebeu 382 votos.
Algo muito curioso é que, no sistema proporcional, não basta um candidato
obter determinado número de votos para que se consagre vencedor. É necessário
mais. É preciso que seu partido, no somatório de todos os votos dados a seus
candidatos, tenha recebido um determinado número mínimo de votos. Esse número
mínimo de votos é conhecido como quociente eleitoral, e é obtido por meio de
uma fórmula matemática aplicada a cada eleição, na qual se incluem o número de
votos válidos e o número de vagas a serem preenchidas.
Mas deixemos os cálculos de lado. O que importa é que, se um partido não
atingir esse "quociente eleitoral", nem mesmo seu candidato mais bem
votado poderá ser eleito, ainda que esse candidato tenha conseguido um grande
número de votos, inclusive superior ao de um rival cujo partido tenha, em sua
totalidade, conseguido atingir aquele número mínimo de votos.
Essa é razão de partidos costumarem colocar como candidatos de sua
legenda até mesmo pessoas sem chances concretas de vitória: o objetivo é
arrebanhar, com pequenos candidatos, aquele número mínimo de votos que
garantirá a efetiva eleição dos "candidatos com reais chances de
vencer".
Afinal, se a dona da confeitaria da esquina de nossa casa for candidata,
nós votamos nela mesmo sabendo que não tem chances, porque ela é simpática e
ainda faz um bolo de baba-de-moça que é uma delícia.
4º - O
"Efeito Barrichello" ou "Florentina de Jesus pra que tu me
seduz"
Já dissemos que, quando o eleitor de Ourinhos vota em Paulo José, ele
acaba, querendo ou não, também votando no Partido “Z”, voto esse que
beneficiará outros candidatos da legenda. É como se outros candidatos viessem
atrás daquele com maior número de votos e aproveitassem o "vácuo" para
vencer a resistência do ar.
Em resumo, o que o TSE faz a cada eleição é calcular, com base no
quociente eleitoral, o número de vagas a ser distribuída para cada partido que
"venceu" a barreira representada por esse mesmo quociente eleitoral.
Basicamente, divide-se o número total de votos dados a um partido por aquele
número mínimo de votos necessários para eleger um deputado, e o resultado da
divisão é o total de vagas destinado a esse partido.
Em outras palavras, cada vez que o número total de votos em um partido
"bate" o "quociente eleitoral", sua legenda tem direito a
mais uma vaga. O número de vagas resultante é o "quociente
partidário", diferente para cada partido em uma eleição.
Com esse número de vagas nas mãos, cada partido deverá preencher as vagas
a quem tem direito com seus candidatos, e isso na ordem decrescente de número
de votos recebidos pelos candidatos de sua legenda.
É essa característica do sistema proporcional que explica, por exemplo,
fenômenos curiosos como o caso do Delegado Protógenes e de outros dois
candidatos que, em 2010, receberam um número pouco expressivo de votos, mas,
apesar disso, foram eleitos Deputados Federais por São Paulo.
Apesar de seu desempenho sofrível nas urnas, ingressaram na Câmara dos
Deputados pela simples razão de que outro candidato de sua legenda, o Tiririca,
ganhou tantos votos que, pelo cálculo do TSE, o partido tinha direito não só a
uma vaga (a do Tiririca) mas a outras tantas vagas, que foram preenchidas por
candidatos sem muito apoio dos eleitores.
5º -
Ganhou só um voto? Parabéns Deputado!
Veja o caso do deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP). Ele obteve em
2010 nada menos que 211 mil votos. Não atingiu o quociente eleitoral daquela
eleição, que em São Paulo foi de 305 mil votos. Portanto, veio “puxado”, como
se diz no jargão eleitoral - de acordo com a Revista Voto.
Outra curiosidade desse sistema é que, por sua lógica, é possível que um
candidato seja eleito apesar de ter recebido apenas um voto: o seu próprio, ou,
se for esquizofrênico, o de sua mãe. Isso pode ocorrer se a legenda tiver
poucos candidatos, como é típico de partidos "nanicos", mas um deles
for, por exemplo, alguma celebridade capaz de atrair milhões de votos.
Esses milhões de votos, digamos para simplificar, "sobram" e,
no cálculo com base no quociente eleitoral, acabam garantido vagas para outros
candidatos do partido, respeitada a ordem em que foram votados. É na verdade o
tal quociente partidário. Se esse partido tiver poucos candidatos alistados na
eleição, o último deles na ordem de votação, aquele que recebeu apenas um voto,
acabará recebendo uma das vagas reservadas ao partido.
6º -
Sistema Distrital puro não é coisa de nazista nem de virgem
O sistema distrital tem uma lógica diferente. Nele, o eleitor não pode
votar em qualquer candidato que concorra a deputado em seu Estado, mas apenas
nos candidatos inscritos pelos partidos em seu "distrito". Distrito,
por sua vez, é uma subdivisão do Estado, que pode ser maior, menor ou do
tamanho de um município, a depender de como será feita a divisão.
Outra diferença em relação ao sistema proporcional é que, no sistema
distrital, cada partido só pode apresentar um candidato por distrito. Os
vencedores da eleição são, simplesmente, aqueles candidatos que mais receberam
votos em cada um dos distritos nos quais é dividido o Estado.
Portanto, cada distrito elege um candidato, e esse candidato foi o único
que representou, no distrito, o seu partido.
Isso significa que, durante o mandato legislativo, todos os eleitores de
determinado distrito sabem exatamente qual o candidato foi eleito por sua
região. Ele tem nome, endereço e cara facilmente identificáveis por esses
eleitores (mesmo pelos que votaram em outro candidato), e todos eles podem
acompanhar sua atuação política de perto.
Além disso, há estreita associação entre o partido e o candidato: o
distrito elegeu não apenas um indivíduo, mas apoiou determinado partido por ele
representado.
Em razão disso, pode ocorrer uma situação interessante. O João da Silva
acorda, passa na padaria e fala para o padeiro: "viu o que o maluco do teu
candidato fez naquela votação do Congresso? Na próxima eleição, temos que
escolher outro partido!".
7º -
Palhaços e representantes sectários têm poucas chances
É comum, no sistema proporcional, que determinadas classes profissionais
elejam seu "representante" no Congresso. Afinal, o somatório dos
votos desses profissionais espalhados pelo Estado pode garantir uma vaga para
seu "colega". O mesmo pode ser dito em relação a alguma celebridade
da mídia, cujos fãs, distribuídos no estado, formam o caminhão de votos
necessários para chegar-se ao poder.
Uma das vantagens do sistema distrital, é que fica muito mais difícil a
eleição de candidatos apoiados por "grupos de interesses sectários" ou
por fãs daquela celebridade engraçadinha que aparece na televisão. A razão é
que esses eleitores estão, de regra, distribuídos por todo o Estado, mas não
teriam força em um distrito específico, composto pelos moradores de alguns
bairros ou municípios. Outra vantagem é eliminar aquela situação estranha, em
que um candidato com pouquíssimos votos acaba sendo eleito por causa de um
outro candidato de maior expressão.
8º - O
principal efeito é a extinção do poder econômico das eleições
O Estado dividido em Distritos, limita geograficamente a atuação do
candidato na campanha eleitoral. Reduzindo o tamanho do território da campanha,
os custos serão pequenos em relação ao que são hoje. Com isso, o nivelamento
entre os candidatos, se dará pelo perfil pessoal e pelo pragmatismo do partido
pelo qual é candidato. Por exemplo: o Partido “Z”, é de direita, e defende o
liberalismo econômico, e Paulo José é um comerciante local, que possui esse
perfil.
Voto Distrital para um Brasil Republicano!
Ricardo Pohlot
Perfeito é Advogado, Especialista em Direito Tributário pela FGV.
5 comentários:
Certa vez, ouvi Cesar Maia dizendo, para uma roda de pessoas antes de um embarque no voo, que : POLÍTICO BRASILEIRO FOGE DO VOTO DISTRITAL COMO O DIABO FOGE DA CRUZ", com certeza deve ser o que há de melhor já que identifica e compromete o eleito com seus eleitores. A cobrança por resultados e o controle ficam bem mais fáceis.
Dá pra resumir (traduzir). Qualquer pessoa que tenha capacidade intelectual para, ler e entender este texto; não precisa lê-lo, pois já devem ser adeptos (se não petistas) da teoria. Seria de bom grado uma versão (do texto) para pessoas com o intelecto baixo como o meu.
Só quero ver como o congresso vota o voto distrital.... Vão aceitar ??? quem vai colocar o guizo no pescoço do gato como diz a antiga estória....
Poderíamos junto disso ,ao invés de só aprovar o voto distrital puro,copiar TODA constituição americana,decorando seus 7 artigos de cara,além das constituições estaduais,ao gosto do freguês.Seria uma urgência ,antes de discutirmos as especificidades do Brasil e suas regiões.Seria o FIM do comunismo no Brasil.
Entendo a lógica do voto distrital para vereador, mas, a partir de deputado estadual, penso ser difícil um candidato ser conhecido e aceito em inúmeros distritos para ser eleito, por exemplo, senador. Como fazer a passagem do interesse específico do distrito para o dos problemas estaduais e nacionais?
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