Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Luiz Antônio
P. Valle
No jogo
todos os movimentos têm sua importância, nada pode ser subestimado. Um erro de
estratégia, a partir de conclusão equivocada oriunda de uma análise ou a falta
dela, pode levar à derrota. Temos olhado para os movimentos da Torre (eixo da
economia) e vimos que há nuvens no horizonte. Se assim é, como um governo bem
informado como os EUA está se preparando? Eles não detectaram os movimentos? Se
os estadunidenses nada estivessem fazendo seria preocupante, podendo mesmo dar
a parecer que os sinais geraram uma apreensão infundada. Temos peças a esquerda
e a direita do rei e da rainha. Neste caso o cavalo da direita, do chapéu
branco, move-se para defender a rainha.
Antes de
entrar neste tema importa frisar que o tabuleiro, que tem sua estrutura
atrelada a regras próprias que independem da vontade do jogador, continua dando
sinais de instabilidade. Cientistas no mundo todo, ainda que evitando divulgar
dados alarmantes, percebem que o planeta está iniciando uma fase de metamorfose
que é cíclica em sua trajetória. O Sol desempenha o seu papel. A costa oeste da
América do Sul não será exceção.
Para
entender melhor a estratégia do cavalo branco faz-se necessário fazer um
retrospecto dos movimentos e juntar os aparentes atos isolados.
Em 01 de
abril de 1979 foi criada nos EUA, através de um Ato Executivo do Presidente
Jimmy Carter, com a ajuda de Zbigniew Brzezinski, a FEMA (Federal Emergency
Management Agency - Agência Federal de Gestão de Emergências), que possuía em
2018 uma dotação orçamentária de US$ 18,4 bilhões. No site do governo dos EUA -
https://www.usa.gov/federal-agencies/federal-emergency-management-agency
é informado que a agência “apoia os cidadãos e o pessoal de emergência para
construir, manter e melhorar a capacidade do país de se preparar, proteger,
responder, recuperar e mitigar todos os riscos”.
Pela
expressão “todos os riscos” pode-se depreender uma enorme gama de espectros. Em
05/10/18 o Presidente Trump assinou a Lei de Reforma da Recuperação de
Desastres - Disaster Recovery Reform Act – https://www.fema.gov/disaster-recovery-reform-act-2018,
que visa “fortalecer a capacidade do país para o próximo evento catastrófico”.
Ao ler a lei e considerar também o robusto orçamento da Agência, e de todos os
demais órgãos federais que são obrigados a cooperar com ela em caso de
decretação de um Estado de Emergência, é possível perceber que os EUA estão se
preparando de forma vigorosa para fazer frente a qualquer eventual fato que
ponha em risco o adequado funcionamento do país.
Em 21/08/17
o jornal Miami Herald - https://www.miamiherald.com/news/nation-world/world/americas/guantanamo/article168273127.html
– divulgou que o governo estadunidense planejava investir até US$ 500 milhões
na atualização das instalações da Base Militar de Guantánamo (GITMO), em Cuba.
Isso incluía uma proposta da Marinha para construir um hospital com um custo
total de US$ 250 milhões. Estas notícias sugeriam aos analistas que a
administração Trump estava se preparando para acrescentar “hóspedes VIP” ao
contingente lá acondicionado, do contrário por que ter numa prisão um hospital
deste porte? A ampliação também aponta para um aumento do número de detentos.
Neste sentido tanto a FEMA quanto o Pentágono têm ampliado sua capacidade de
receber “hóspedes”.
Em 21
dezembro de 2017, exatos 04 meses depois da notícia veiculada acima, o
então Secretário de Defesa dos Estados
Unidos, General James Mattis (conhecido também como “Mad Dog”) realizou uma
visita sem precedentes, e sem aviso prévio, a Base Militar de Guantánamo
(GITMO) em Cuba, sendo a primeira visita feita por um secretário de Defesa dos
EUA em quase 16 anos - https://nypost.com/2017/12/21/mattis-makes-unusual-visit-to-gitmo/.
Ele pessoalmente vistoriou as instalações e determinou o que precisava ser
feito para que GITMO estivesse em condições de cumprir a sua missão.
No mesmo
dia da visita do General James Mattis a GITMO entrou em vigor o Estado de
Emergência nos EUA, e obviamente a coincidência de datas não foi um acaso. O
Presidente Trump assinou no dia 20/12/17 uma Ordem Executiva, entrando em vigor
as 00:00hrs do dia 21/12/17, declarando Estado de Emergência, e certamente não
preciso enfatizar, para os bons entendedores, qual a extensão dos poderes que
isso confere e o significado de tal decisão, o que certamente tem implicações
gravíssimas. A história - cobertura parcial são as violações de direitos
humanos e atos de corrupção. A Ordem Executiva confere poderes inclusive de
bloquear bens, incluídos aí ativos financeiros, e delega poderes a todas as
agências/órgãos para fazer cumprir a ordem.
Nela Trump
afirma: “Eu, portanto, determino que os graves abusos dos direitos humanos e a
corrupção em todo o mundo constituem uma ameaça incomum e extraordinária à
segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos, e eu
declaro uma emergência nacional para lidar com essa ameaça”. Observe que uma
crise no sistema financeiro internacional nos moldes que descrevi nos dois
primeiros artigos da série xeque-mate pressupõe necessariamente que haja
corrupção e abuso. Estando em vigor nos EUA um Estado de Emergência para lidar
com esta situação os instrumentos para debelar uma crise tornam-se muito mais eficazes.
Quem quiser
conferir segue endereço do site da Casa Branca:
Montou-se
um arcabouço legal para dar suporte às ações necessárias para lidar com
questões que ponham em risco a segurança nacional dos EUA. Este arcabouço conta
ainda com outras estruturas jurídicas, tais como a Lei de autorização de Defesa
Nacional (NDAA – National Defense Authorization Act), assinado em 31 de
dezembro de 2011 pelo presidente Obama e a Lei McCarran, conhecida
como Lei de Segurança Interna de 1950, ainda em vigor. A Seção 1021 da NDAA,
inciso c, possui em sua redação uma permissão: (1) “A detenção em virtude da
lei de guerra sem julgamento até o final das hostilidades autorizadas pela
Autorização do Uso da Força Militar" - https://mococivilrights.wordpress.com/campaigns/ndaa/mccrc-ndaaaumf-resolution/sections-1021-1022-of-ndaa/.
Alguns
juristas entendem que, numa interpretação extensiva, esta redação pode autorizar
a detenção forçada de cidadãos em caso de distúrbios generalizados, após a
decretação de uma emergência nacional ou de um colapso econômico total. Já a
Lei McCarran permite a detenção de
pessoas perigosas, desleais ou subversivas em tempos de guerra ou “emergência
de segurança interna” - https://en.wikipedia.org/wiki/McCarran_Internal_Security_Act.
Ademais,
como citei no último artigo da série xeque-mate, o Congresso dos EUA aprovou
uma lei (H.R. 6566) que obriga a FEMA (Federal Emergency Management Agency) a
preparar-se para um “planejamento de morte em massa” enquanto os cemitérios e
funerárias estiverem lotados pela consequência de um “atentado terrorista”,
“desastres naturais” ou “outro tipo de crise”. Desta forma vemos que os EUA
construíram uma legislação que dá amparo ao Presidente para tomar atitudes
enérgicas e rápidas em caso de grave crise e ameaça à segurança nacional, ou
mesmo a eclosão de uma guerra civil, se for o caso.
Mas
antes que as ações de superfície comecem é necessário estar pronto para
imobilizar eventuais reações adversas. Verificando o sistema Public Access to
Court Electronic Records (PACER - https://www.pacer.gov/)
ficou evidenciado um aumento atípico de processos selados nas cortes
estadunidenses. No período de 30/10/17 a 22/11/17 foram detectados 4.289
processos selados (segredo de justiça) em andamento na justiça americana, ou
seja, em apenas 3 semanas chegou-se a este montante em todos os 94 distritos
federais estadunidenses, quando a média histórica para 12 meses (um ano) não
passa de mil.
Estes
processos atualmente já ultrapassam a casa de 30 mil. Alguns futuros “réus”
possivelmente nem sabem ainda que o são. A reação com maior potencial ofensivo
será anulada antes de começar, e GITMO vai ajudar neste quesito. A Câmara dos
EUA autorizou no mês passado, numa decisão inusitada, a transmissão ao vivo de
julgamentos em tribunais militares estadunidenses.
Paralelamente,
as Forças Armadas dos EUA exercitam-se para fazer valer suas prerrogativas em
caso de crise. Como citei no último artigo da série xeque-mate o Exército dos
EUA inundou os céus de Washington D.C. em 22 de julho de 2019 com helicópteros
de combate Sikorsky UH-60 Black Hawk num exercício para proteger prédios
federais, talvez prevendo um possível agravamento da situação interna dos EUA -
https://www.bloomberg.com/.
Isto faz parte de um plano maior ligado ao Projeto REX84 (Readiness Exercise
1984 - https://en.wikipedia.org/wiki/Rex_84),
também conhecido por fazer parte de um conceito denominado de COG (Continuity
of Government- https://en.wikipedia.org/wiki/Continuity_of_government),
que tornou-se público durante as audiências no escândalo Irã-Contras de 1987, e
estabelece procedimentos bem definidos que viabilizem ao governo continuar suas
operações essenciais em caso de um evento catastrófico, tratando-se de um
planejamento do governo dos EUA para pôr a prova a sua capacidade e prontidão
para, inclusive, controlar e deter um grande número de cidadãos em caso de uma
emergência nacional ou de desobediência civil.
Assim,
como pode ser visto ao se juntar as peças, as autoridades dos EUA não estão
inertes. Já há algum tempo, vem se preparando para uma provável crise,
investindo milhões, talvez bilhões de dólares nesta preparação. Criaram
organizações federais, reformaram estruturas físicas, puseram em vigor a base
jurídica necessária para dar legalidade aos atos, anteciparam-se investigando e
processando em sigilo elementos que possam vir a prejudicar o seu planejamento,
mobilizam e exercitam os recursos de força indispensáveis para fazer valer e
cumprir o que está planejado.
O
potencial de concretização de eventos desfavoráveis ao Brasil, ligados a variáveis
exógenas, envolvem riscos muito mais severos e iminentes do que o terrorismo, o
tráfico de drogas e tantos outros tão propalados. Pela sua capacidade de
relevante impacto a curto prazo, estes fatores exógenos, que envolvem
alterações significativas no Sistema Financeiro Internacional com devastador
impacto na economia, deveriam ser o principal tema de estudo de pensadores de
Geopolítica, Inteligência e Estratégia brasileiros. Todavia, não parece sê-lo.
Consequentemente o Brasil não possui elementos de mitigação de risco eficazes
para lidar com uma crise nas proporções esperadas, estando relevantemente
vulnerável.
Estamos
num mundo conturbado, em severa mutação, cujas consequências vão remodelar as
relações de poder de forma dramática. As decisões, ou falta delas, vão
repercutir de forma enfática no futuro da nação brasileira.
Todo
jogo acaba ou muda de fase. O xeque-mate se aproxima.
Luiz
Antonio Peixoto Valle é Professor e Administrador de Empresas.
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